São Paulo, segunda-feira, 30 de abril de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

As desventuras de Zé Ramalho no país de Raul Seixas


Cantor enfrenta a recusa de Paulo Coelho para liberar parcerias e brigas entre os herdeiros


PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

Zé Ramalho não imaginou a quantidade de problemas que teria para concretizar o projeto "Zé Ramalho Canta Raul Seixas", lançado agora pela gravadora BMG.
Escolher uma dezena entre cerca de 300 canções de Raul Seixas (1945-89) poderia ser o maior desafio, mas não foi.
No correr do projeto, Zé enfrentou a ira santa dos herdeiros do roqueiro e a recusa de Paulo Coelho em ter incluídas suas parcerias com Raul.
Coelho vetou "Cachorro Urubu" (73), "Medo da Chuva" (74) e "Eu Nasci Há 10 Mil Anos Atrás" (76) quando já estavam gravadas. "Causou-me espanto a atitude antipática de Paulo Coelho, usando meu projeto para fazer suas picuinhas. Não se dignou a conversar comigo nem com a gravadora, só mandou uma lauda explicando o assunto", reclama Zé.
"O sacana é que ele esperou determinado ponto de andamento do disco, para causar muito prejuízo."
"Tivemos que quebrar milhares de discos. Paulo Coelho foi executivo de gravadora nos anos 70, sabe muito bem o prejuízo que isso causou", continua.
Coelho diz que nunca foi procurado por Zé (só pelo produtor do CD) e se defende: "Zé Ramalho também trabalha há muito tempo em música e sabe que autorizações para músicas são sempre pedidas antes da gravação. O procedimento de direito autoral exige por lei que o contrato seja assinado antes de a obra ser produzida".
Coelho explica o porquê de seu veto: "Zé Ramalho, que hoje reclama, deve estar ciente de que muitos outros cantores, conhecidos ou desconhecidos, tiveram autorizações negadas por causa do seu disco".

Negativas
Ele se refere, neste ponto, à posição de uma das ex-mulheres de Raul, Kika Seixas, que lhe explicou via carta que negava várias autorizações, representando sua filha com Raul Vivian, "para que o projeto de Zé Ramalho não perdesse em ineditismo".
Volta Coelho: "É uma atitude profundamente arbitrária, injusta. Inclusive eu, o próprio parceiro, que desejava promover Raul Seixas nos diversos países em que tenho livros publicados, tive negada a autorização para um CD. Não vou permitir que meu trabalho seja manipulado dessa maneira, favorecendo apenas Zé Ramalho, em detrimento de muitos outros cantores que tiveram as autorizações negadas só para que ele pudesse gravar seu disco sem concorrência".
É hora de Kika Seixas entrar no tiroteio: "Paulo Coelho não merece nem mesmo uma resposta minha. Na sua megalomania, tinha a intenção de promover o Raul no exterior? Ele só está interessado em se autopromover, e ponto".
Zé Ramalho, por sua vez, vai adiante na artilharia: "A maior pilantragem de Paulo Coelho é que liberou minha versão de "Há 10 Mil Anos Atrás" para a novela das 19h da Globo, e não para o meu CD. Foi a grande canalhice dele, que teve medo de a Globo lhe dar uma raquetada. Essa atitude prova uma pessoa maquiavélica, rancorosa, vingativa e covarde".
Coelho: "É mentira. Dei a autorização para a TV Globo porque (o diretor musical da rede) Mariozinho Rocha me telefonou pedindo. Zé Ramalho jamais me ligou, impedindo uma conversa que pudesse solucionar o problema, já que luto para poder gravar minhas músicas por qualquer pessoa".

Bode expiatório
Coelho afirma que Kika Seixas usa Zé Ramalho como bode expiatório de outra guerrilha, desta vez com Scarlet, filha de Raul com Gloria Vaquer (ambas moram nos Estados Unidos).
Scarlet proibiu a veiculação de outra faixa que estaria no CD de Zé Ramalho, "Equilíbrio", suposta letra inédita de Raul musicada por Zé.
O cantor dá sua versão: "Kika Seixas me mandou textos de Raul, dos quais escolhi um para musicar. Eu tinha permissão dela, pensei que isso resolvia a questão. Scarlet veio dos EUA especialmente para me impedir, dizem que manipulada pelo P.C.. As filhas de Raul têm vergonha do pai, o odeiam pela vida trágica e pela forma como foram criadas".
É a vez de Scarlet protestar: "Meu pai era um gênio, admiro ele e seu trabalho. Sei que não escreveu aquela canção. Pergunte a qualquer um que tenha conhecido meu pai se acredita que ele escreveria aquelas palavras rasas".
Kika aperta o gatilho: "A filha americana de Raul nunca teve contato com o pai, não fala nem entende português e é portanto completamente incapaz de atestar a autenticidade de "Equilíbrio". A letra original foi datilografada pela companheira de Raul na época, Helena Coutinho, mas contém diversas correções manuscritas pelo próprio Raul. Se houver interesse em fazer um estudo grafológico, oferecemos o original em nosso poder".
Scarlet tem mais acusações: "Zé Ramalho é um joguete nas mãos de Kika. Ela usa tudo que encontra pela frente para fazer dinheiro. Agora que a fonte está secando está inventando histórias e usando pessoas inocentes como Zé Ramalho como suas vítimas".
Kika, de novo: "Está se vendo que essa moça está por fora do que acontece na música aqui no Brasil, pois afirmar que Zé Ramalho é um joguete em minha mãos e até patético".
"Esse tipo de postura leviana e difamatória de Scarlet contra minha pessoa e a de Zé Ramalho afeta as outras duas herdeiras de Raul, prejudica a belíssima homenagem que Zé fazia e desacredita o espólio de Raul Seixas."
Feito cego no tiroteio, Zé Ramalho se desconsola com os rumos tomados por seu projeto ("tive raiva e vontade de largar o trabalho, mas meu carinho com o trabalho do Raul era muito maior") e resume seu ânimo atual:
"Tenho seis filhos e, quando isso tudo aconteceu, liguei a todos eles para explicar. Disse que isso são os herdeiros do Raul e que espero que eles nunca façam isso comigo, que não sejam egoístas e mesquinhos, que pensem na obra de seu pai quando ele morrer".
Falar sobre o disco de Zé Ramalho e a obra de Raul Seixas? Bem, não sobrou mais espaço.



Texto Anterior: Personalidade: Eddie Van Halen anuncia que sofre de câncer
Próximo Texto: Frases
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.