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São Paulo, quarta-feira, 30 de abril de 2003

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POLÍTICA CULTURAL

Contrapartida social é oficializada, cultura popular tem prioridade; produtores apontam "dirigismo"

Estatais definem critérios de patrocínio

SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

As empresas estatais Eletrobrás - Centrais Elétricas Brasileiras S.A (que há cinco anos figura entre os três maiores incentivadores culturais do país) e Furnas Centrais Elétricas divulgaram na semana passada os critérios que passarão a adotar, a partir deste ano, para o patrocínio de projetos culturais.
O setor cinematográfico reagiu com indignação e críticas de um suposto "dirigismo cultural" por parte do governo federal. A política de patrocínios culturais na gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva vem sendo traçada pela Secom (Secretaria de Comunicação de Governo), do ministro Luiz Gushiken. Os critérios da Eletrobrás e de Furnas configuram sua primeira oficialização.
A Eletrobrás relaciona, entre outros, o objetivo de "atuar em sintonia com o programa Fome Zero, tendo como diretriz fundamental a exigência de contrapartidas sociais, notadamente geração de emprego e renda para as comunidades carentes, capacitação de jovens para a produção de cultura popular e acesso gratuito ou a preços populares a atividades culturais".
Furnas também estabelece que "as contrapartidas sociais devem ser de âmbito compensatório, como permitir acesso gratuito ou a preços populares para o público-alvo prioritário -jovens de comunidades de baixa renda, portadores de deficiência física, portadores de doenças crônicas graves, idosos, estudantes de escolas públicas".

Ruptura
Os critérios das duas empresas para avaliação dos projetos culturais a serem beneficiados são praticamente idênticos.
As duas estatais informam que investirão em cultura através da Lei Rouanet, de renúncia fiscal. A Lei do Audiovisual -também de renúncia fiscal, mas específica para a produção de cinema- não é mencionada.
"O atual governo teve a prudência e a sabedoria de não ocasionar rupturas econômicas e sociais. Na questão da política cultural está havendo uma ruptura", diz o produtor cinematográfico Luiz Carlos Barreto.
Barreto estima que uma das consequências da nova política de patrocínios será "um baque na produção do cinema brasileiro, exatamente quando ele atravessa um de seus melhores momentos".
A dificuldade do setor cinematográfico seria atender os critérios de contrapartida social estabelecidos pelo governo, já que o produtor de um filme não tem autonomia sobre a exibição e não poderia, por exemplo, garantir uma cota de ingressos gratuitos para sua temporada nos cinemas.
"Somos produtores, não difusores culturais. Não se pode exigir de nós o papel da difusão", diz o cineasta e produtor Toni Venturi, presidente da Apaci (Associação Paulista de Cineastas).
Barreto afirma que "a contrapartida social básica e primeira é a própria geração do produto cultural". E diz que os critérios anunciados "dirigem a produção de cultura para um único viés, sendo que o dirigismo cultural nunca deu certo, nunca enriqueceu cultura nenhuma".
A ausência da Lei do Audiovisual na política de patrocínios das estatais reforça um temor surgido entre produtores de cinema quando o consultor Yacoff Sarkovas passou a prestar serviços à Secom, na formulação dessas políticas. Sarkovas é considerado um especialista em produção cultural com pouco apreço pelo cinema.
"A contratação [pelo governo federal] de uma consultoria cultural não entra na nossa compreensão. A consultoria cultural de um governo é o Ministério da Cultura", afirma Barreto.
Venturi acha que a questão "está tendo tanto ruído porque está no lugar errado". A Apaci defende que o Ministério da Cultura, e não a Secom, encarregue-se da definição de patrocínios culturais.


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