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RODAPÉ
Um guia de viagem para a pós-modernidade
MANUEL DA COSTA PINTO
COLUNISTA DA FOLHA
Pós-moderno é um dos conceitos mais controvertidos
nas discussões sobre estética e
cultura -o que torna fundamental um livro como o organizado
pelo editor J. Guinsburg e pela arte-educadora Ana Mae Barbosa.
Com mais de 700 páginas e quase
30 colaboradores, "O Pós-Modernismo" esquadrinha praticamente todas as formas de manifestação daquilo que é definido ora como um estilo (ou um "não-estilo"
caracterizado pelo pastiche e pelo
ecletismo), ora como superestrutura da era pós-industrial -mas
que, para alguns teóricos, não
passa de rótulo ideológico para
tornar palatável a "lógica cultural
do capitalismo tardio" (subtítulo
de um estudo célebre de Fredric
Jameson).
O livro comporta todas essas visões. Traz ensaios sobre arquitetura, cinema, tecnologia, música,
antropologia, estudos culturais,
dança, teatro e sobre o papel da
moda na "sociedade do espetáculo". Graças ao trabalho de Ana
Mae, inclui contribuições sobre
arte-educação, feminismo e multiculturalismo de ensaístas norte-americanos como Arthur Danto e
Lucy Lippard (criadora do conceito de "desmaterialização da
obra de arte", mobilizado pela
Bienal de São Paulo de 1996).
A literatura aparece nas reflexões de Ricardo Araújo sobre
poesia brasileira, mas estranhamente não há espaço para a prosa
-que poderia proporcionar exegeses de inúmeros autores, desde
Georges Perec até Thomas
Pynchon ou brasileiros como Silviano Santiago e Bernardo Carvalho.
A seção inicial traz textos mais
teóricos e abrangentes. Na impossibilidade de analisar aqui os ensaios de Luiz Nazario, Laymert
Garcia dos Santos, Ricardo Timm
de Souza ou Eduardo F. Coutinho, pode-se depreender deles
que a resistência ao pós-modernismo como "filosofia portátil" de
um "narcisismo militante" (expressões da psicanalista Maria
Inês França) se deve a seu caráter
anti-utópico.
O próprio prefixo "pós" remete
à negatividade em relação ao modernismo, no qual as idéias vanguardistas de ruptura e revolução
se sustentavam sobre um desejo
de autodeterminação que faria do
homem um senhor de seu destino
(daí o investimento simbólico na
figura do artista-soldado, sacerdote laico de um mundo sem deuses).
O refluxo das utopias políticas e
científicas (as "grandes narrativas" descritas por Lyotard), uma
modalidade de capitalismo que
plasma toda experiência em objeto de consumo, e a proliferação
das tecnologias desumanizadoras
transformaram as vanguardas
num receptáculo vazio. O hedonismo estético da "pop art" e o
ilusionismo da indústria cultural
seriam manifestações dessa esquizofrenia auto-referente, segundo veredicto de Jameson.
No entanto, o pós-modernismo
conserva, em seus momentos
mais iluminados, um sentido crítico que funciona como antídoto
para as pretensões triunfalistas.
Como mostra Ricardo Fabbrini,
as apropriações que artistas como
Regina Silveira e Barbara Kruger
fazem (respectivamente) do
"ready-made" de Duchamp e dos
cartazes políticos dos futuristas
russos evitam a "fetichização do
moderno", inscrevendo a vanguarda em novas condições históricas, em que a falência da arte é a
imagem em negativo da banalidade do real.
O Pós-Modernismo
Organização: J. Guinsburg e Ana Mae
Barbosa
Editora: Perspectiva
Quanto: R$ 95 (712 págs.)
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