São Paulo, quinta-feira, 30 de abril de 2009

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Crítica/"Milagre em Santa Anna"

Spike Lee supera excesso de temas

Com boas sequências, diretor aborda a participação de soldados negros na Segunda Guerra em filme que mistura assuntos

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Há filmes que se perdem por falta do que dizer. "Milagre em Santa Anna" corre o risco de se perder por excesso do que dizer. No início temos uma ação policial: um pacato funcionário dos correios mata friamente um cliente que aparece à sua frente. Quem é esse homem? Por que fez isso? Tudo que se descobre é uma cabeça de estátua italiana, perdida desde a explosão de uma ponte, durante a Segunda Guerra Mundial.
Somos então projetados, em flashback, de 1983 para 1944: Segunda Guerra, avanço dos Aliados na Itália, um batalhão de soldados negros na luta por Santa Anna, cidade da Toscana.
É então que as várias linhas que desenvolve Spike Lee no roteiro de James McBride começam a se desenvolver e, não raro, se acotovelar no filme.
Há o racismo dos oficiais, para começar (os soldados atravessam um rio, o que era sua missão; o oficial não acredita neles apenas por serem negros). Depois, há o conhecimento que passamos a desenvolver do grupo: o honesto Stamps, o sargento disposto a acreditar que o racismo começa a acabar; o sensual Cummings, que não leva fé nessa história de integração; o simplório Train e o porto-riquenho Negron. Negron é quem, quase 40 anos depois, será assassino.
Nessa ação, Train encontra um menino traumatizado pelas ações militares e passa a protegê-lo. Levam-no à cidade, onde vive a família da bela Renata. Lá haverá alemães, de um lado, e partisans, de outro. Entre os alemães, os que não acreditam mais na luta e os que desertam.
Entre os partisans, um traidor. Ufa! O filme mal começou e já temos tudo isso -resumindo bem. O "plot" policial desaparece (só retornará no final). O filme permanece na guerra, e na guerra Spike cria algumas sequências notáveis. Uma delas: o carro de som com a alemã que tenta fazer propaganda e seduzir os soldados negros, de maneira a que desertem.
No meio de uma dolorosa travessia de um rio, isso faz um efeito, e Spike obtém uma atmosfera estranha, em que se encontram som e imagem, o interior do carro de som e o campo de batalha, os soldados americanos e os alemães.

Excessos
Mais adiante outro momento forte. Depois que o desinibido Cummings transa com Renata, a tensão entre Cummings e Stamps (que também a desejava) explode, feroz.
Há momentos menos felizes, sobretudo quando Spike calca a mão na violência de certas cenas. O único equívoco imperdoável do filme, no entanto, talvez seja o fato de o roteiro ter sido escrito pelo autor do romance, o que resulta num excesso de questões. Ainda assim, esse tipo de problema é preferível à insuficiência de ideias quase crônica da maior parte dos filmes em cartaz atualmente.


MILAGRE EM SANTA ANNA

Produção: EUA/Itália, 2008
Direção: Spike Lee
Com: Derek Luke, Michael Ealy
Onde: a partir de hoje no Unibanco Arteplex e no Espaço Unibanco Pompeia
Classificação: não indicado para menores de 16 anos
Avaliação: bom



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