São Paulo, Quinta-feira, 30 de Setembro de 1999
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CINEMA

"Goya", de Saura, encerra hoje Festival do Rio

CRISTINA GRILLO
da Sucursal do Rio

Autor de filmes politicamente engajados -caso de "Los Ojos Vendados" (1978)-, o cineasta espanhol Carlos Saura, 67, define "Tango" (1998), que será exibido hoje no último dia do Festival do Rio 99, como "um pouco autobiográfico", mas muito político.
Autobiografia e política se unem quando o diretor usa o tango para criar uma coreografia com referências claras à tortura e ao desaparecimento de pessoas durante a ditadura argentina.
A associação da música com a tortura tem raízes na infância e juventude do diretor.
"Eu ouvia muitos tangos quando era criança, ao lado de meu pai. Depois, o tango passou a ser, para mim, a música usada para abafar os gritos nas sessões de tortura nos porões franquistas."
Saura está no Rio para a exibição de "Tango" e de "Goya", seu mais recente trabalho.
Para ele, a memória de anos de ditaduras, torturas e desaparecimento de pessoas ainda está muito presente nos países da América Latina, o que faz com que sua estabilidade democrática seja tênue e que sua população tenha receio de falar sobre o assunto.
Saura parte de um fato concreto: as ameaças sofridas, na Argentina, por pessoas que atuaram nas filmagens de "Tango".
Para o cineasta, a citação das torturas da ditadura argentina e sua associação com o gênero musical pode ter irritado alguns setores da sociedade do país.
"Na Argentina, no Chile e em outros países latino-americanos, a situação ainda é muito delicada. Há a democracia, mas também há muitas histórias ainda não contadas e muitos setores que não querem que essas histórias sejam contadas", diz o diretor.
Em "Tango", Saura narra a história de um diretor teatral em crise após ser abandonado pela mulher. Ele está preparando um espetáculo sobre o gênero musical argentino e apaixona-se por uma de suas atrizes, namorada do produtor do espetáculo.
Em "Goya", biografia em ritmo teatral do pintor espanhol Francisco Goya (1746-1828), Saura conta que fez "um caminho novo". O filme será exibido hoje à noite no cinema Odeon (centro do Rio), na sessão de encerramento do Festival do Rio 99.
Nele, Saura conta que ampliou as experiências visuais de "Tango", feitas em parceria com o diretor de fotografia Vittorio Storaro. "Criamos grandes superfícies em plástico, como telas gigantescas que são usadas como paredes falsas e podem ser iluminadas pelos dois lados", diz.
O diretor vinha tentando fazer "Goya" há dez anos. "Os produtores só querem filmes que vendam, façam sucesso de bilheteria, e não acreditavam que "Goya" seria capaz disso." O sucesso de "Tango" no mercado internacional impulsionou "Goya". "Descobriram que eu consigo fazer filmes que dão dinheiro", ironiza Saura.
No Rio, ele aproveita para iniciar pesquisas para o projeto de um musical, voltado para a dança -como "Bodas de Sangue", "Carmen" e "Tango"-, mas inspirado na música brasileira.
O diretor explica que se interessa pela fusão de vários elementos na cultura brasileira. "Há poucas culturas musicais que se atualizam e estão vivas. No Brasil há uma mescla de culturas que cria algo novo, com passado, presente e um futuro possível."


Filme: Tango
Onde: Estação Icaraí (r. Coronel Moreira Cesar, 211, Icaraí, Niterói); às 16h30
Filme: Goya
Onde: cine Odeon (pça. Marechal Floriano, centro); às 20h




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