São Paulo, domingo, 30 de setembro de 2007

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Darín vive detetive em filme noir

Ator argentino, que fez "Nove Rainhas" e "O Filho da Noiva", protagoniza "La Señal", que tem exibição no Rio

A morte do cineasta Mignogna, que convidara Darín para o filme, levou o argentino a também assumir a direção do projeto

SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL AO RIO

Filho de atores, Ricardo Darín começou a se tornar íntimo dos palcos aos 10 anos de idade.
O maior astro do cinema argentino atual nunca estudou interpretação, mas acha que aprendeu o ofício da melhor forma possível -"com adultos que não se davam conta de estar ensinando a uma criança".
Na ausência do "tom acadêmico", julga ele, as lições não são propriamente memorizadas, mas sim "gravadas a fogo" no aluno que as aprende.
E uma coisa que Darín aprecia são as lembranças perenes. "Não esqueço quase nada. Tenho uma memória obsessiva. Lembro das coisas que aconteceram e da forma que as pessoas se comportaram comigo."
No seu catálogo de memórias, as ruins também ficam arquivadas, mas com a condição de não abrir caminho ao ressentimento. "Não caio nessa armadilha. Se você for rancoroso, fica com a pior parte", diz.
Já as boas recordações estão sempre escapando do baú, para influenciar o presente de Darín. É o caso da que o fez estrear como diretor num longa em que apenas atuaria -"La Señal" (o sinal), atração de amanhã no Festival do Rio.

Paternal
Darín aceitara o papel do protagonista do filme, proposto pelo diretor Eduardo Mignogna, que havia sido "muito generoso e paternal" com ele no "começo da carreira", ou seja, na sua infância, quando Mignogna fazia parte do círculo de convívio de seus pais.
Pouco antes das filmagens, no ano passado, Mignogna sucumbiu ao câncer, aos 66 anos. "O mínimo que eu poderia fazer era não tirar o corpo fora e concluir o trabalho dele", afirma Darín, que convidou Martín Hodara para dividir com ele a direção do filme, sem abandonar o papel do protagonista.
Ele interpreta o detetive Corvalán, que investiga casos de traição conjugal e outras banalidades, ao lado do sócio Santana (Diego Peretti, de "Não Sou Eu, É Você"). A rotina de Corvalán muda quando uma sedutora e misteriosa mulher o contrata para seguir os passos de um homem, sem explicar que informação quer obter, mergulhando sua carreira (e sua vida) numa trama de negócios ilícitos e vinganças familiares.
Santana, o sócio de Corvalán, acha que a vida emite sempre"um sinal" quando está prestes a mudar de rumo -daí o título. Corvalán descrê da teoria e se envolve com a mulher que era um alarme ambulante.
Mignogna havia contado esta história num livro, antes de pretender filmá-la. Quando assumiu a direção do longa, Darín modificou o roteiro.
"A trama policial ganhou força e deixou a história um pouco mais escura, densa, áspera", conta. "La Señal" ganhou, enfim, os ingredientes para se transformar num filme noir.
"Descobrimos que, fazendo o filme assim, estaríamos homenageando o cinema de gênero e produzindo um título muito raro na Argentina hoje."
Recém-estreado em Buenos Aires, o filme convenceu crítica e público. No Brasil, a data de lançamento está indefinida.
Hodara, que co-dirige "La Señal" com Darín, era assistente de direção de Fabián Bielinsky, o autor de "Nove Rainhas" e "Aura", ambos estrelados pelo ator. Bielinsky morreu no ano passado, em SP, onde gravava um comercial. Aos 47 anos, era hipertenso e sofreu infarto.
"Entre Fabián e eu houve uma coisa difícil de acontecer -você se tornar muito amigo de alguém quando adulto. Éramos confidentes, amigos a ponto de dizer um ao outro a verdade absoluta. E isso nos impressionava, porque éramos muito diferentes. Ele era reflexivo, sério, direito, um homem incrível. Ainda me custa muito falar dele sem me emocionar", diz.
Darín acha que ainda não "completou o luto por Bielinsky, porque sua morte foi tão abruptamente surpreendente que é como se ele ainda estivesse aqui". Por isso, quer suspender as atividades nos próximos meses, "para fazer nada, em casa, e rever tudo o que aconteceu nos últimos tempos".
Esses tempos em que ele dirigiu seu primeiro longa, no qual há uma cena em que dois grandes amigos se despedem para sempre. Pensando bem, pode ser um sinal de que Darín nem tirou o corpo fora da tarefa de levar adiante o projeto de Mignogna, nem se esqueceu de estrear na direção com alma.


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