São Paulo, terça-feira, 30 de outubro de 2007

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Em disco novo, Nação Zumbi foge do mangue

Em "Fome de Tudo", banda acentua estilo experimental e inclassificável

Álbum tem produção de Mario Caldato Jr., que já trabalhou com os Beastie Boys, e participação da cantora Céu, entre outros

Julia Moraes/Folha Imagem
Membros da Nação Zumbi, que lança seu sétimo disco


ADRIANA FERREIRA SILVA
EDITORA DO GUIA DA FOLHA

Famintos por informações sonoras, literárias, cinematográficas, cibernéticas, psicodélicas. Assim a Nação Zumbi chega ao sétimo disco, anunciando no título suas intenções.
Em "Fome de Tudo" -que vai para as prateleiras hoje, mas já está na rede-, o grupo pernambucano dilui ainda mais características como o uso da percussão ou as referências regionais que marcaram sua primeira fase e também o mangue beat, uma das ondas mais inventivas do rock brasileiro na década passada.
"Até hoje, há a idéia de que somos uma banda de maracatu", fala o vocalista Jorge du Peixe, 40. "Apesar de usarmos os tambores, nunca fomos. Conseguimos nos desvencilhar desse rótulo", diz ele.
No novo álbum, eles aprofundam as experimentações sonoras que pontuam sua discografia desde a estréia, com "Da Lama ao Caos" (1994), e que se acentuaram em "Futura", de 2005. Rock, funk, rap, psicodelia, samba, maracatu. Traços desses estilos se misturam para resultar num som difícil de classificar (desgraça para nós, jornalistas, que adoramos etiquetar). "A gente faz música livre", explica Jorge. "Está em nosso inconsciente confundir mesmo."
"Não tem necessidade de dizer que é isso ou aquilo", completa o guitarrista Lúcio Maia, 36. "Tchaikóvski, por exemplo, é música clássica hoje. Naquela época, não era chamado de música clássica", cita Maia. Os dois são, talvez, os rostos mais conhecidos da banda, que tem ainda o baixista Dengue, o baterista Pupillo e os percussionistas Gilmar Bola 8 e Toca Ogan.

Produção badalada
Ao contrário dos álbuns mais recentes, produzidos pela própria banda, as criações de agora passaram pelas mãos de Mario Caldato Jr.
Brasileiro radicado nos Estados Unidos, Caldato é responsável por alguns dos melhores discos do Beastie Boys e já trabalhou com Beck, Planet Hemp e Marcelo D2, entre outros. "Mario é um cara muito tranqüilo, voltado para o trabalho. De doidão já basta a banda", descreve Maia. Foi graças ao produtor que o tecladista Money Mark, o quarto "Beastie Boy", participou do disco.
Mario Caldato também está entre os motivos para a troca de gravadora, da Trama para a Deck Disc. "Pensamos em renovar o contrato, mas chegava a ser indecorosa a proposta da Deck", fala Maia. "Eles toparam fazer um disco com o Mario, gravado no Rio e em São Paulo. O João Marcelo Bôscoli [presidente da Trama] disse que não poderia cobrir essa proposta."

Fome
Mas não é só na superfície sonora que a Nação Zumbi se aplica. Desde os tempos de Chico Science, as letras são quase como um manifesto, sejam elas a favor da "afrociberdelia" ou de coisas mais mundanas, como tomar uma cerveja antes do almoço "para ficar pensando melhor". A fome, literal ou metafórica, é o tema da vez.
"Começamos por Josué de Castro [intelectual, autor de "Geografia da Fome", de 1946]", lembra Jorge. "Esse foi o primeiro mote para Chico [Science] em "Da Lama ao Caos"."
"Hoje, a fome ultrapassou a barreira do conceito básico. Existe fome para tudo", acredita Maia. "Você acompanha as notícias na internet? Então, tem fome de informação. Além disso, ainda existe a fome propriamente dita. Velha e nunca vai se acabar", aposta Maia.
Autor da maioria das letras, Jorge du Peixe simplifica e esfria as expectativas de famintos por explicações filosóficas: "Tentar achar um sentido para tudo o que eu estou falando é a mesma coisa que perguntar para um pintor por que ele usou aquele azul ou amarelo. Prefiro deixar as pessoas interpretarem. Nem eu lembro porque eu escrevi aquilo ali."
A voz de Du Peixe soa mais limpa em refrões contundentes, marcados por participações como a de Céu, singelo contraponto em "Inferno", ou Junio Barreto, co-autor de "Toda Surdez Será Castigada".


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