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São Paulo, domingo, 30 de novembro de 2003

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TV

Autor, que foi afastado de "Esperança" em 2002, descreve mágoa com a Globo, critica "Celebridade" e volta com novela inédita em 2005

"Novelista é um infeliz", diz Ruy Barbosa

RODRIGO RAINHO SILVA
FREE-LANCE PARA A FOLHA

As novelas de Benedito Ruy Barbosa, 73, voltam ao ar a partir do próximo ano -o tira-gosto é o remake de "Cabocla" (1979), que será adaptado pelas filhas Edmara e Edilene. O pai afirma que será apenas um consultor. E retorna para valer em 2005, com uma obra inédita que vai mostrar histórias da metrópole paulista.
Em seu sítio em Sorocaba, a 90 km de São Paulo, o autor se mostra recuperado dos problemas de saúde que teve durante a exibição de "Esperança" (2002).
Enquanto fala de suas novelas, se gaba todo. Quando o assunto é política, demonstra raiva e inconformismo. Se o assunto é Movimento dos Sem Terra ou o povo brasileiro, lágrimas escorrem dos olhos do novelista que conseguiu fazer a Globo "balançar", com o fenômeno "Pantanal" (1990), exibido na extinta TV Manchete.
"Cabocla" foi outro de seus "fenômenos", mas aconteceu em 79, às 18h. "Esse horário quem implantou fui eu, com "Meu Pedacinho de Chão" (71/72). Foi uma novela que entrou no ar e explodiu. Foi a única na história, no mundo, que passava quatro vezes por dia, na Cultura e na Globo", diz.
Antes de "Cabocla", vieram "O Feijão e o Sonho" (76), "À Sombra dos Laranjais" (77); depois, "Paraíso" (82/83), "Voltei pra Você" (83/84), "Vida Nova" (88/89) e o sucesso internacional "Sinhá Moça" (86). Do horário das seis e da Globo ele saiu para tocar "Pantanal", em 1990.

Mágoa com a Globo
A volta ao horário vespertino, com "Cabocla", após anos na noite, foi presente da Globo, que o decepcionou em 2002, após tirá-lo do comando de "Esperança" e colocar Walcyr Carrasco no lugar.
Neste ano, recusou convites para escrever minisséries, como "Carga Pesada". "Para escrever, tem de estar com tesão. Ainda não sinto isso. Estou magoado com o que aconteceu. Magoado comigo", afirma. "Não me conformo, me senti derrotado. Sou ariano! E ariano não sabe perder."
Em meados de 2005, após a sucessora de "Celebridade", Ruy Barbosa volta ao horário nobre e quer dedicar um papel da prometida novela urbana a Raul Cortez. "Se Deus quiser, ele estará na próxima. Não posso falar muito do personagem, mas vai", afirma. "Meu contrato com a Globo vai até 2007. Eu não posso ficar até esse ano sem fazer nada."
Entre as novelas no ar atualmente, a sua preferência é, no mínimo, irônica: "Chocolate com Pimenta", de Walcyr Carrasco. "Tem dia que dá mais ibope que a novela das oito." Afirma que acertou o passo com Carrasco.
"Ele estava muito ressabiado comigo. Falei para o Mário [Lúcio Vaz, diretor da Globo]: "Não deixa esse cachorro na minha frente, eu dou porrada. Você sabe que eu sou caipira". Teve uma reunião de autores, em Angra. E ele veio falar comigo", narra Barbosa. "Coitado, ele veio tão tímido, é menino ainda. Abracei-o. Estamos bem."
Faz questão de ressaltar que jamais assumiria uma obra alheia. "Uma vez o Boni pediu para eu terminar "Os Gigantes", que Lauro César Muniz escrevia. Não aceitei", diz. "Novelista é um infeliz, passa por cada uma." Para voltar ao batente, parou de fumar e fez terapia. Engordou oito quilos.
Uma das marcas mais admiradas pelos fãs de Ruy Barbosa não sai de suas novelas: o tom romancista, de época, sem grandes apelações. Em "Cabocla", afirma que essa essência continuará. "Você tem que ter um compromisso com esse povão. A moral brasileira é heterogênea. Se uma menina do sertão fizer o que a menina de Ipanema faz, o pai mata, põe fora de casa, não aceita isso. Ainda existe esse conservadorismo."
Sobre o sexo e a nudez do horário nobre em "Celebridade", Barbosa é enfático: "Estão jogando errado", afirma. "Na medida em que apelam com sexo, perdem audiência, não ganham. O erotismo não está na banalidade e na vulgaridade, que é contraproducente, não estimula. Pelo contrário, dá nojo. Afasta e faz o público perder interesse."
A nova novela, cuja sinopse está sendo elaborada, se passa na São Paulo contemporânea. "Será uma novela urbana paulista. Não quero mais fazer italiana, chega. Fiz quatro novelas sobre imigração: "Os Imigrantes", "Terra Nostra", "Esperança" e "Vida Nova". Tenho que inovar."
Mas como escrever história em São Paulo sem fugir do tema da imigração? "Não farei a coisa de forma intencional, o ser humano é que importa, de que nacionalidade for", diz. "As pessoas se vêem nas novelas. Por isso é um produto televisivo imbatível. A guerra civil da Nicarágua parava para o povo ver "Sinhá Moça". Não é mito, é realidade."


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