São Paulo, sexta-feira, 30 de novembro de 2007

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Crítica/Hong Sang-soo

Festival destaca filmes de coreano que evita excessos

Cineasta difere de conterrâneos ao evitar violência gráfica e poesia forçada

DO CRÍTICO DA FOLHA

Fim do jejum. Com a chegada do festival Indie a São Paulo, depois de sete edições bem-sucedidas em Belo Horizonte, o espectador paulistano vai, finalmente, poder conhecer a obra de um dos mais instigantes cineastas contemporâneos: o coreano Hong Sang-soo.
O Indie apresentará, de hoje até a próxima quinta-feira, no Cinesesc, com entrada franca, 25 filmes de dez países, todos inéditos na cidade.
No conjunto, encontram-se títulos que chegam com boas referências, como o argelino "Bled Number One", o chinês "A Outra Metade" e o norte-americano "Monstros de Quatro Olhos".
A cereja do bolo, contudo, é a apresentação de seis dos sete filmes dirigidos por Sang-soo (quatro deles com cópias em película).
Ao contrário de outros cineastas coreanos já exibidos comercialmente no Brasil, o excesso visual, a violência gráfica e a poesia forçada passam longe do universo deste diretor.
O primeiro fator que chama a atenção em seus filmes é a regularidade: de temas, de situações, de uso expressivo de técnicas (como a zoom).
Em todos os seus sete longas há cenas de bebedeira e cenas de sexo, há encontros com conhecidos ao acaso e, sobretudo, há personagens que se conhecem, flertam, transam e depois se desentendem.
Esse tipo de resumo sugere uma banalidade temática que percorre a obra de Sang-soo e ela de fato é predominante. Ao contrário dos filmes independentes americanos, este vazio não é preenchido com psicologia de botequim ou pseudo-filosofia existencial.

Poesia do banal
Como no cinema do francês Éric Rohmer, uma das mais evidentes influências da obra de Sang-soo, o banal funciona como uma armadilha para o olhar desatento. Uma história de amor começa, se desdobra, alcança aquele ponto inevitável em que se aproxima do fim e, subitamente, é outra história que passamos a assistir, que de algum modo ecoa aquela primeira.
Ou são os dois personagens envolvidos numa mesma história, da qual vemos primeiro a perspectiva de um, depois a de outro, ou pode ser as de ambos embaralhadas. Uma mesma cena, de amor físico, sobretudo, pode se repetir com pequenas variações.
Trata-se de um cinema que exige muita atenção, pois seu segredo se esconde nas minúcias dos gestos que diferem e nos instantes que produzem as rupturas.
Não é fácil tentar identificar tramas em seus filmes. O que Sang-soo encena são situações, daí a impressão de uma sucessão de esquetes e de histórias que parecem nunca começar.
Desta indeterminação, porém, é que resulta uma sofisticação que pode passar despercebida. Ela se concretiza, em particular, na forma como o diretor manipula o tempo, rompendo a linearidade e a univocidade. Suas elipses abruptas são os mais seguros índices de que algo se passou.
Como nas nossas vidas, o modo como Sang-soo conduz seus personagens nos leva a perceber e concordar que o tempo tem lá suas próprias regras. E que só nos resta estar bem atentos a seus efeitos.
(CÁSSIO STARLING CARLOS)


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