São Paulo, sexta-feira, 31 de março de 2006

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ÚLTIMA MODA

Francisco Costa concorre ao Oscar da moda

O designer da Calvin Klein é o primeiro brasileiro a ser indicado para prêmio do Conselho de Estilistas dos EUA

O estilista Francisco Costa, diretor de criação da Calvin Klein, foi indicado na terça-feira para os prêmios anuais do Council of Fashion Designers of America (conselho de estilistas dos EUA). Ele é o primeiro brasileiro a ser selecionado para a premiação -uma espécie de Oscar da moda americana. Costa, 40, concorre na categoria melhor coleção feminina, ao lado de Marc Jacobs e dos designers Lazaro Hernandez e Jack McCollough, da grife Proenza Schouler. O vencedor será conhecido em junho.
Mineiro de Guarani, Francisco Costa mudou-se para os Estados Unidos no início da década de 90. Estudou moda e trabalhou com Oscar de la Renta, Pierre Balmain e Tom Ford (na Gucci). Em 2003, foi contratado por Calvin Klein, que o indicou como seu substituto ao vender a grife.
A indicação da CFDA consagra o estilista brasileiro nos EUA. "Fiquei muito feliz, ainda mais que estou há apenas quatro anos na Calvin Klein", disse ele à Folha, por telefone. Na entrevista a seguir, Costa afirma que a moda "fica mais real quando parte da necessidade das pessoas" e sugere aos estilistas brasileiros apostarem mais numa simplicidade elegante e sem vulgaridade.

 

Folha - Como você concilia a sua criação com o estilo esportivo tradicional da Calvin Klein?
Francisco Costa -
Eu tento fazer uma aproximação moderna, nova, irreverente do espírito da marca. Mas ainda não fui totalmente bem-sucedido. Minha primeira coleção foi algo mais soft. Na segunda, tentei fazer uma coisa mais Calvin e fui criticado imensamente. Acho que as pessoas querem que você encontre o seu próprio caminho e desenvolva um espírito novo para qualquer casa onde trabalhe.

Folha - Qual a principal contribuição de Calvin Klein à moda?
Costa -
O atemporal, aquela roupa de qualidade que se pode vestir sempre. Eu gosto de olhar a moda desse jeito. Vestir a roupa que está muito "na moda" realmente fica meio cafona. Acho "fashion victims" um saco.

Folha - A alfaiataria foi importante na sua coleção de inverno, não?
Costa -
Sim, grande parte da coleção, fora os vestidos, foi composta por blazers e calças.

Folha - Você não acha que a temporada de inverno foi marcada, sobretudo na Europa, por um toque masculino nas coleções femininas?
Costa -
Acho que sim. É uma tendência, porque passamos por dez anos de Prada, daquela linha que é uma coisa linda, muito feminina, mas cujo look ficou muito fácil de as pessoas entenderem e copiarem. O momento agora é de alguma coisa nova, mais forte, com uma certa base masculina.

Folha - O estilo de feminilidade criado pela Prada já passou?
Costa -
Sim.

Folha - A própria Prada mostrou uma coleção um tanto indecisa nesta temporada, você concorda?
Costa -
Totalmente.

Folha - Para você, que já trabalhou com Oscar de la Renta e Pierre Balmain, qual é a diferença entre a moda americana e a européia?
Costa -
Acho que a moda americana é mais fácil, pelo fato de ser menos elaborada. Isso ocorreu desde o início. Claire McCardell [1905-1958, considerada a primeira grande estilista americana] ia à Europa e recriava tudo da maneira mais simples possível, em tecidos mais baratos. Por quê? Porque era roupa para vender em supermercados e lojas de departamento. Agora, do ponto de vista estético, a moda americana é totalmente européia.

Folha - Esteticamente, a moda americana não tem uma personalidade própria?
Costa -
A mulher americana tem. A moda na Europa é muito mais um "look" [imagem]. Aqui é sobretudo um "lifestyle" [estilo de vida]. Mas, curiosamente, foi Chanel quem criou a idéia de lifestyle e sportswear, porque precisava de jérsei, que era mais barato no final da guerra, porque ela viajava muito para Biarritz... Ela buscou o que estava precisando e, coincidentemente, o mercado estava precisando também. Calvin Klein e Ralph Lauren foram inspirados por Chanel. Acho que a moda fica mais real quando parte da necessidade das pessoas. As modas francesa e inglesa são laboratórios. São roupas muito pensadas, menos espontâneas.

Folha - Você também trabalhou com Tom Ford, conhecido por imprimir um estilo supersexy à moda. Esse estilo ainda tem valor?
Costa -
Acho que sim, pois, quanto mais segura é a mulher, mais liberdade ela tem de se expressar. Mas, depois que Tom saiu da Gucci, tudo ficou muito chato por lá.

Folha - O sexy à la Tom Ford ainda tem importância?
Costa -
Ainda vale a essência, mas não a mesma forma. Ele chegou a um limite. Quando você olha aquilo hoje, vê que ficou uma coisa vulgar. Hoje a mulher é um pouco mais discreta, mas sem ser chata e conservando a sua espontaneidade.

Folha - O que falta à moda feita no Brasil?
Costa -
Ela está bem forte, hoje. O que falta a ela é se posicionar melhor no mercado global, com mais vigor. Acho também que os estilistas têm que olhar mais para o país. Às vezes folheio umas revistas do Brasil e vejo uns tecidos tão pesados... Não é confortável para o nosso clima. Por outro lado, não é o caso de limitar a criação, pois é preciso competir internacionalmente.

Folha - Se você fosse fazer moda no Brasil, em que apostaria?
Costa -
Acho que voltaria a uma simplicidade que existiu no Brasil nos anos 70. Seria muito interessante. Me lembro muito de fotos de mulheres fantásticas, como a Maísa, que tinha uma presença fortíssima e usava roupas muito simples e básicas. Eu apostaria mais nisso, nesta simplicidade forte, nos tecidos que são realmente para o nosso clima, leves e fáceis, e nas cores, pois é muito gostoso usar cores em países tropicais. Acho que o mercado mundial espera isso do Brasil, além de uma sensualidade discreta. As brasileiras são versáteis e criativas no modo de vestir -e são até bem seguras. Só acho que às vezes elas se expõem demais. Muita barriga de fora não fica elegante.

Barbudos voltam à publicidade fashion

Durante longo tempo banidos das publicidades de moda, os barbudos estão voltando com força aos anúncios das grifes. A Ralph Lauren saiu na frente, mostrando rapazes que lembram rockeiros dos anos 60/70, como Eric Clapton. Barbas já aparecem também em publicidades da L'Oréal e da Calvin Klein. Não se trata mais daquelas barbichas por fazer, miúdas e juvenis, mas de camadas mais volumosas de pêlos. No Brasil, a onda existe há algum tempo -é marca registrada de Los Hermanos-, mas impera mais na política que na publicidade.
Nos Estados Unidos, a tendência já está nas ruas, no mundo da música (com as barbas neo-hippies de Devendra Banhart e sua turma) e vai sendo difundida, em variados estilos, por atores como Gael García Bernal, Heath Ledger, de "Brokeback Mountain", e Hugo Weaving, de "V de Vingança", o novo filme cult dos irmãos Wachowski. Um dos ícones no cinema é o personagem de George Clooney em "Syriana". A onda da barba entre os atores e em círculos moderninhos nos EUA levou o "New York Times" a dedicar ao assunto um artigo de capa do caderno "Styles" (23/3).
Com o fim do metrossexual e a crise da imagem "baby face" (homem com jeito de garotão), a barba se tornou o melhor adereço da nova masculinidade -mais madura e confiante-, transmitindo de quebra um ar de nobreza e inconformismo.

NAKAO ENTRA PARA A HISTÓRIA
O estilista brasileiro Jum Nakao é o único latino-americano convidado a participar da exposição "Showtime" no Palácio Galliera - Museu da Moda de Paris. A exposição faz um apanhado da história da moda para tentar entender a sua força atual, com looks memoráveis de Chanel, Dior, Courrèges, Miyake, Gaultier, entre outros. Nakao reconstruiu em Paris um dos vestidos de papel de seu famoso desfile de 2004, quando as modelos ao final rasgaram todas as roupas.

ITEM DE COLEÇÃO
Karl Lagerfeld é o editor convidado da edição de abril da "Elle" inglesa. O estilista alemão da Chanel, que é também fotógrafo, clicou a cantora pop Christina Aguilera para a capa da revista, a modelo Lily Cole num editorial feito nas ruas de Paris e a atriz Selma Blair. A revista traz também uma interessante entrevista com Lagerfeld feita pelo estilista inglês Giles Deacon. O alemão conta que Kate Moss fará a nova campanha da Chanel e se define assim: "Eu sou uma pessoa superficial -muito informada, mas superficial. E eu trabalho muito para continuar superficial!".


ALCINO LEITE, com Viviane Whiteman - ultima.moda@folha.com.br

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