|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
RÉPLICA
"Filme é oportunidade histórica de reavaliar a música de Simonal"
Filho do cantor diz que Ilustrada errou ao ressaltar parte de documentário em que relação do pai com a ditadura é tratada
MAX DE CASTRO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Não escrevi este texto
para defender uma
pessoa, um artista ou
um membro da minha família.
Estou aqui para fazer justiça
a uma obra artística. Ao contrário do que foi dito pelo crítico
de música (eu disse MÚSICA)
na Ilustrada de 24/3, o documentário "Ninguém Sabe o
Duro que Dei", de Cláudio Manoel, Micael Langer e Calvito
Leal, não é uma investigação
sobre a relação do artista Wilson Simonal com a ditadura
militar. É preciso que isso fique
claro, porque essa informação
errada pode tirar o interesse
das pessoas em assistir ao filme
e assim arruinar todo o trabalho, pesquisa, cuidado, tempo e
dinheiro das pessoas envolvidas nesta produção.
O documentário é sobre a saga de um homem negro, filho
de uma empregada doméstica,
que sai da pobreza, do nada, para se tornar um dos maiores artistas do Brasil durante os anos
1960.
De uma maneira bem clara,
sua história, ascensão e queda
são contadas por meio de grandes momentos do cantor no
palco e costuradas por depoimentos muito relevantes de
pessoas (de diversas áreas) que
foram testemunhas e ajudaram
a construir o que se convencionou chamar de "Cultura Brasileira". José Bonifácio "Boni" de
Oliveira, Pelé, Paulo Moura,
Nelson Motta, Ziraldo, Chico
Anysio, Sérgio Cabral e Barbara Heliodora, só para citar alguns que participam do filme.
Após se tornar o primeiro
popstar negro do país, Simonal,
no auge de sua carreira, se envolveu em um caso policial que
acabou se transformando num
grande tabu da recente história
do Brasil e motivação para jogar no ostracismo um artista
inegavelmente muito talentoso. Tal episódio é esclarecido
pela primeira vez em 37 anos,
inclusive pelo depoimento do
contador, que foi justamente o
pivô da história.
Entre os relatos e as opiniões, a responsabilidade nesses eventos do artista é amplamente discutida. De pano de
fundo há um debate muito interessante sobre o racismo, a
irritação que a música comercial causa quando é bem-feita e
bem-sucedida, as delícias e os
excessos da vida burguesa, os
deslumbres da fama, a intransigência da imprensa como resposta à truculência da ditadura; por tudo isso e muito mais,
o filme vale a pena ser visto.
Registro oficial
Acima de tudo, é uma oportunidade histórica de ver e reavaliar a música de Simonal, que
é tão única, charmosa, gostosa e
original, já que, até então, não
havia nenhum registro oficial
disponível de sua arte além de
alguns discos.
É uma pena que, mesmo com
o espaço enorme que a Folha
concedeu mais uma vez a Wilson Simonal (a tão desejada capa da "Ilustrada'!!!), o crítico
musical não tenha tido "calma"
suficiente para analisar a obra
em questão. Infelizmente, perdeu-se mais uma grande chance. Talvez ele não se lembre ou
não conheça a célebre frase do
"Zaratustra", de Nietzsche: "Eu
posso admirar sem mágoa uma
ventura tamanha".
Max de Castro é músico, compositor, produtor,
cantor e filho de Wilson Simonal
Texto Anterior: 114 mil viram peças, diz organização Próximo Texto: Reportagem destacou contador Índice
|