São Paulo, segunda-feira, 31 de março de 2008

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RÉPLICA

"Filme é oportunidade histórica de reavaliar a música de Simonal"

Filho do cantor diz que Ilustrada errou ao ressaltar parte de documentário em que relação do pai com a ditadura é tratada

MAX DE CASTRO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Não escrevi este texto para defender uma pessoa, um artista ou um membro da minha família.
Estou aqui para fazer justiça a uma obra artística. Ao contrário do que foi dito pelo crítico de música (eu disse MÚSICA) na Ilustrada de 24/3, o documentário "Ninguém Sabe o Duro que Dei", de Cláudio Manoel, Micael Langer e Calvito Leal, não é uma investigação sobre a relação do artista Wilson Simonal com a ditadura militar. É preciso que isso fique claro, porque essa informação errada pode tirar o interesse das pessoas em assistir ao filme e assim arruinar todo o trabalho, pesquisa, cuidado, tempo e dinheiro das pessoas envolvidas nesta produção.
O documentário é sobre a saga de um homem negro, filho de uma empregada doméstica, que sai da pobreza, do nada, para se tornar um dos maiores artistas do Brasil durante os anos 1960.
De uma maneira bem clara, sua história, ascensão e queda são contadas por meio de grandes momentos do cantor no palco e costuradas por depoimentos muito relevantes de pessoas (de diversas áreas) que foram testemunhas e ajudaram a construir o que se convencionou chamar de "Cultura Brasileira". José Bonifácio "Boni" de Oliveira, Pelé, Paulo Moura, Nelson Motta, Ziraldo, Chico Anysio, Sérgio Cabral e Barbara Heliodora, só para citar alguns que participam do filme.
Após se tornar o primeiro popstar negro do país, Simonal, no auge de sua carreira, se envolveu em um caso policial que acabou se transformando num grande tabu da recente história do Brasil e motivação para jogar no ostracismo um artista inegavelmente muito talentoso. Tal episódio é esclarecido pela primeira vez em 37 anos, inclusive pelo depoimento do contador, que foi justamente o pivô da história.
Entre os relatos e as opiniões, a responsabilidade nesses eventos do artista é amplamente discutida. De pano de fundo há um debate muito interessante sobre o racismo, a irritação que a música comercial causa quando é bem-feita e bem-sucedida, as delícias e os excessos da vida burguesa, os deslumbres da fama, a intransigência da imprensa como resposta à truculência da ditadura; por tudo isso e muito mais, o filme vale a pena ser visto.

Registro oficial
Acima de tudo, é uma oportunidade histórica de ver e reavaliar a música de Simonal, que é tão única, charmosa, gostosa e original, já que, até então, não havia nenhum registro oficial disponível de sua arte além de alguns discos.
É uma pena que, mesmo com o espaço enorme que a Folha concedeu mais uma vez a Wilson Simonal (a tão desejada capa da "Ilustrada'!!!), o crítico musical não tenha tido "calma" suficiente para analisar a obra em questão. Infelizmente, perdeu-se mais uma grande chance. Talvez ele não se lembre ou não conheça a célebre frase do "Zaratustra", de Nietzsche: "Eu posso admirar sem mágoa uma ventura tamanha".


Max de Castro é músico, compositor, produtor, cantor e filho de Wilson Simonal


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