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Mostras exibem filmes radicais de japoneses
Em SP, "Oriente Extremo" mostra longas de Suzuki e Miike, entre outros
Produção cinematográfica do país não se resume a Kurosawa e Ozu; CCBB também tem ciclo
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Um tsunami mais que esperado desembarca em duas
grandes ondas neste mês em
São Paulo. O espetacular cinema japonês, que muitos sabem
que não se resume aos clássicos
Kurosawa, Ozu e Mizoguchi,
poderá ser visto em duas mostras. A primeira, "Oriente Extremo", acontece de amanhã
até o dia 18, no Cine Olido. A segunda, "Japão Pop", ocupará os
CCBB de SP e de Brasília de 28
de junho a 9 de julho.
"Oriente Extremo" não se resume ao novo. De fato, a mostra
resgata uma tradição do cinema japonês desconhecida ou
esquecida por aqui: a de filmes
populares e ao mesmo tempo
de pura invenção.
Dividida em dois blocos
-precursores e contemporâneos-, a seleção será exibida
em formato digital com legendas em português. Do primeiro
bloco, destacam-se "Onibaba",
ficção assombrosa em vários
sentidos feita por Kaneto Shindo, que mergulha aqui na tradição das histórias de fantasmas,
cara ao cinema japonês de ontem e de hoje.
"Jigoku", feito por Nobuo
Nakagawa, explora a reserva do
fantástico dentro de uma história de matriz realista que se
desdobra em uma viagem sobrenatural ao inferno, relido
aqui numa perspectiva budista.
Ainda dos anos 60, a mostra
exibe "Cega Obsessão", obra-prima de Yasuzo Masumura.
Para narrar a paixão, Masumura recria todo um universo visual a partir de fetiches (um cenário constituído por enormes
seios, por exemplo) e alcança
um patamar de erotismo que
poucos filmes eróticos de fato
atingem.
A seleção de precursores se
fecha com a exibição de dois títulos de Seijun Suzuki, cineasta
cultuado por sua geração de
contemporâneos. Suzuki começou a dirigir
nos anos 50, com
filmes que levaram para a tela o
universo adolescente e juvenil
fervilhante de invenções daquela
época no Japão e
no mundo. Mas
foi na década seguinte que seu registro visual atípico ganhou um culto. Desta fase, a
mostra apresenta
dois títulos dedicados a heróis yakuza, tema que
Suzuki recolheu
da tradição para
implodir os significados e as regras
de representação.
O que já é evidente em "Tóquio
Violenta" torna-se surpreendente
em "A Marca do Assassino".
Tal como seu contemporâneo Godard fazia com o cinema
àquela altura na Europa, também para Suzuki as regras existem para ser desrespeitadas.
Continuidade e contigüidade
são ignoradas, os enquadramentos são desenquadrados e a
gramática é tratada como camisa de força a ser abolida. O resultado é um cinema de pura
invenção, em que a realidade é
reinterpretada como ponto de
vista gráfico.
No bloco dos contemporâneos, a "Oriente Extremo"
mantém o alto padrão. Traz
"Tetsuo -°O Homem de Ferro",
título que levou o Japão de volta ao paladar das descobertas,
depois de décadas entregues ao predomínio dos clássicos.
Sem recursos e com
muita inventividade,
esses cineastas romperam as barreiras do
realismo, da verossimilhança e do bom
gosto para entregar
obras que interpretam de forma menos
codificada seus fantasmas pessoais e os
do Japão. A tecnologia retorna como pesadelo sob a forma de
monstruosidades
meio homens-meio
máquinas em "Tetsuo" e "Dragão Elétrico 80.000 V". Os
imprescindíveis são o
polêmico "Battle Royale" e os dois filmes
de Takashi Miike. Último filme
dirigido pelo veterano Kinji
Fukasaku, "Battle Royale" provocou uma comoção social no
Japão e arrecadou muito nas
bilheterias com sua abordagem
transgressora da violência.
Com estrutura de game, o filme expõe o espectador a tanta
violência e é movido por uma
lógica destrutiva tão intensa
que não se esgota nela mesma.
Acaba provocando uma reflexão sobre as implicações da exposição à violência tal como vivida hoje nas variadas formas
de entretenimento.
Miike, ex-aluno e ex-assistente de direção de Imamura, é
um prolífico criador (69 filmes
em 15 anos) cujo universo temático e formal ignora a palavra limite. Sinônimo de excesso, seus filmes são tão obscenos
que deixam o espectador em
dúvida acerca de seu valor estético. A provocação de suas imagens é um antídoto ao mundo
limpo e organizado que o Japão
oficial transmite e trazem a potência de um vocábulo em desuso: provocação.
ORIENTE EXTREMO
Quando: de amanhã até dia 18, em
horários variados
Onde: Cine Olido (av. São João, 473,
SP, tel. 0/xx/11/3334-0001)
Quanto: entrada franca
JAPÃO POP
Quando: de 28/6 a 16/7, em horários variados
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil (r. Álvares Penteado, 112, SP,
tel. 0/xx/11/3113-3651)
Quanto: R$ 2 a R$ 4
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