São Paulo, terça-feira, 31 de julho de 2001

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LITERATURA

Obra do italiano Silverio Corvisieri conta a história da bailarina

Marietta Baderna vai dos dicionários à biografia

KATIA CALSAVARA
FREE-LANCE PARA A FOLHA

A bailarina Marietta Maria Baderna (1828-1870) é quase desconhecida nos livros de dança, mas habita as páginas de dicionários há tempos. O verbete "baderna", além de confusão, desordem e barulho, fala em "uma dançarina que esteve no Rio em 1851", segundo o Aurélio.
Italiana, seguidora de Giuseppe Mazzini, Baderna se exilou no Brasil em 1849 e, em pouco tempo, ganhou o palco e o público do teatro São Pedro de Alcântara, no Rio, que vivia lotado com os "badernistas" -partido criado por fãs em homenagem a ela.
Os passos de Baderna instigaram a curiosidade do autor italiano Silverio Corvisieri, que foi militante do Partido Comunista e três vezes deputado. Após anos de pesquisas em cinco países, ele desembarca no Brasil no dia 3 para o lançamento de "Maria Baderna -°A Bailarina de Dois Mundos".
Em entrevista à Folha, Corvisieri fala que seu interesse pela dança nasceu durante a pesquisa, não antes disso, e que gostaria de reencontrar Lula no Brasil. "Eu o conheci quando eu era deputado e ele, um corajoso sindicalista."
Baderna já havia sido tema de artigo do jornalista brasileiro Moacir Werneck de Castro, que fantasiou sobre a saga da bailarina de verbete em dicionários.
"Sem querer, acertei no essencial. Baderna foi mesmo ativa politicamente. Coloquei-a lutando ao lado de Bento Gonçalves e como subversiva nas ruas do Rio. Mas sua história real é mais interessante", diz Werneck.
Na Itália, Corvisieri já pesquisava sobre Baderna e, depois de ler o texto de Werneck, veio para o Rio. Ele sabia que a história retratada no artigo não era verdadeira e se embrenhou em descobrir a real.
"No começo, os cariocas usavam o termo baderna para indicar coisas muito belas. Somente depois de a dança ser considerada fator de corrupção da juventude, a palavra assume os significados atuais", diz Corvisieri.
A pesquisa revelou uma bailarina-estrela que, além da técnica primorosa, mostrava expressão e beleza capazes de obscurecer o brilho das divas do canto lírico.
Sempre à frente de seu tempo, Baderna se interessou pelos ritmos afro-brasileiros e saiu às ruas para ver o requebrar das mulatas. Em pouco tempo foi considerada a musa do lundum, da cachuca e da umbigada, danças com movimentos bastante ousados para a época de dom Pedro 2º.
Havia quem dissesse que Baderna bebia demais e era viciada em absinto, além de ser muito namoradeira. "Seu desaparecimento pode estar ligado ao desgaste físico provocado pelo abuso das bebidas", conta o autor.
Mais da metade dos artistas europeus que vieram com ela para o Brasil morreu de febre amarela. Baderna caiu de cama duas vezes, mas resistiu, ao contrário do pai.
Seu estilo de vida, considerado transgressor, deu à bailarina uma existência plena em dois mundos: de noite, uma sílfide nos palcos, de dia, uma revolucionária.


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