São Paulo, sábado, 31 de julho de 2010

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CRÍTICA MEMÓRIAS

Alusão a Borges não esconde defeitos de novo Paulo Coelho

MANUEL DA COSTA PINTO
COLUNISTA DA FOLHA

"O Aleph", novo lançamento de Paulo Coelho, tem o mesmo título da narrativa que dá nome ao livro de contos publicado pelo escritor argentino Jorge Luis Borges no ano de 1949.
Nos dois casos, o termo cabalístico se refere a um ponto do espaço que contém todos os pontos e do qual se pode contemplar, simultaneamente, a totalidade dos acontecimentos da história.
Borges enxerga nesse mirante cósmico, encontrado num porão de Buenos Aires, o "inconcebível universo", mas só consegue enumerar cenas triviais da vida privada (seu quarto vazio, cartas numa gaveta de escrivaninha) e relances de sua poética (labirintos, tigres, livros), numa ironia em relação ao alcance da imaginação literária.
O Aleph de Paulo Coelho é bem mais concebível, ao menos para os crédulos leitores de livros espíritas e manuais de autoajuda: um observatório de vidas passadas que ele utiliza a bel-prazer, como um guia turístico, a bordo da ferrovia Transiberiana.

O JOIO E O TRIGO
Também é infinitamente menos irônico que o escritor argentino.
Não existe (como havia em Borges) uma dissonância entre o autor empírico, real, e um narrador supostamente autobiográfico.
Paulo Coelho crê (ou quer nos fazer crer que crê) que a violinista turca Hilal resolve acompanhá-lo nessa travessia não apenas por ser uma fã ensandecida de seu breviário esotérico, mas porque ambos estiveram frente à frente durante a Inquisição espanhola do século 15.
Pois é disso que trata o livro: durante uma crise espiritual, o mago dos best-sellers atravessa a Ásia com sua corte (editora, intérprete, jornalistas), mas encontra uma figura misteriosa que dará um sentido espiritual a sua peregrinação midiática. Enfim, a comparação com Borges só se justifica por uma coincidência de títulos, que obriga o leitor a separar o joio do trigo.


O ALEPH

AUTOR Paulo Coelho
EDITORA Sextante
QUANTO R$ 24,90 (256 págs.)
AVALIAÇÃO ruim




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