São Paulo, sexta-feira, 31 de agosto de 2007

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THIAGO NEY

A música do mundo

Em seu segundo disco, a cantora M.I.A. se apropria como ninguém do "maldito" termo "world music"

"EU ODEIO world music." Assim David Byrne iniciava seu furioso ataque à generalização criada em torno do termo "world music". O longo texto foi publicado pelo "New York Times" em outubro de 1999.
A expressão maldita surgiu em algum lugar dos anos 80, entre o lançamento de um disco de batuque de Paul Simon e uma viagem exótica de Peter Gabriel. Serve para abrigar com condescendência artistas de lugares exóticos como Mali, Bulgária, Camboja e, claro, Brasil.
"World music" refere-se a tudo e a nada ao mesmo tempo. Música de caráter genérico, e é isso que tirou a paciência de David Byrne. Pois o termo "world music" ganhou nova conotação com "Kala", o segundo álbum de M.I.A., lançado há pouco no exterior.
Nascida na Inglaterra e criada no Sri Lanka, M.I.A. faz em "Kala" o que ela apenas ensaiou em "Arular", o disco anterior.
"Kala" é uma volta ao mundo: ragga, funk carioca, bhangra, rap, música africana, Baltimore club, indie rock, pop dos anos 80... O que faz de M.I.A. não uma caricatura, mas uma artista única, é o fato de ela utilizar essas referências não como um fim em si, mas como ingredientes para a sua própria música: o electro.
M.I.A. não usa timbres indianos como elementos deslocados -na faixa "Bamboo Banga", que abre o disco, esses timbres estão tão intrínsecos à música quanto as batidas eletrônicas quebradas. E mais: a canção também faz referência a "Roadrunner", canção clássica de Jonathan Richman (da banda americana Modern Lovers).
Em "Jimmy", ela utiliza batidas synth-pop que remetem ao pop dos anos 80 -e é, também, uma adaptação de uma antiga trilha de um filme de Bollywood.
As referências estão por toda a parte. Em "$20", M.I.A. faz citação a "Where's My Mind", clássica faixa dos Pixies, em meio a efeitos e barulhos diversos.
Esse clima cosmopolita de "Kala" certamente foi criado pela decisão de M.I.A. de chamar uma série de produtores para ajudá-la a confeccionar o álbum. Estão no disco, entre outros, Diplo, Timbaland e, principalmente, o inglês Switch, um dos mais criativos DJs do mundo.
"Bird Flu", "Boyz", "XR2"... M.I.A. vai despejando batidas poderosas. Curiosamente, o melhor de "Kala" está em sua faixa mais melódica, "Paper Planes". É quase uma balada, em que M.I.A. canta devagar, acompanhada por um coral de crianças. Um rap climático, decorado por sintomáticos barulhos de armas.
O termo "world music" nunca foi tão apropriado.

 

O DJ e produtor carioca Sany Pitbull é outro que faz bom uso da "world music". Com técnica perfeita, seus sets misturam funk carioca, rock e pop. Ele acaba de tocar na Finlândia, no Pori Jazz, um dos maiores festivais de música da Escandinávia. É isso: funk carioca na Finlândia... Dê uma olhada no vídeo. No YouTube, digite Sany Pitbull. E veja o que ele faz com um sampler MPC.

thiago@folhasp.com.br

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