São Paulo, segunda, 31 de agosto de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Filme de Eliane Caffé tem pré-estréia na cidadezinha em que foi rodado, no vale do Jequitinhonha, e chega a São Paulo nesta semana
"Kenoma" faz caminho de volta do sertão de Minas a São Paulo

ALEXANDRE MARON

enviado especial a Araçuaí (MG)

Quando o filme "Kenoma", dirigido por Eliane Caffé, 36, estrear na próxima sexta em São Paulo, a experiência vivida pelos espectadores acomodados nas poltronas das salas refrigeradas será muito diferente do que aconteceu no último dia 23 de agosto. No início daquela noite, em Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha (MG), cerca de 7.000 pessoas, de pé, já se acotovelavam nos arredores do Mercado Municipal, um prédio com 2500 m2 na área central da cidade. Eram apenas 18h30 e a projeção ao ar livre do filme "Kenoma" estava programada para as 20h30.
Araçuaí teve uma sala de projeção há muito tempo, cerca de 25 anos. No dia 23, por algumas horas, a cidade ganhou um cinema novamente.
No palco armado em frente ao mercado, cinco corais se apresentavam cantando músicas típicas da região. Noutro dia seriam ovacionados. Naquela noite, todos esperavam ansiosos e pediam que o filme começasse logo.
Depois das apresentações musicais, emocionada, Eliane Caffé falou na importância daquele filme para ela e para todos ali. Ela foi rápida, também queria que tudo começasse logo. Ia assistir a outro filme. Queria ver as expressões dos rostos de sua audiência.
Na primeira fila, os cidadãos do município que participaram das filmagens esperavam para se ver na tela. Sua primeira experiência com o cinema já os trazia como personagens da trama, expostos na tela de 7m x 12m, pintada em branco na parede do mercado.

Convidados especiais
A maior parte dos convidados que ocupavam a primeira fila viera diretamente do pequeno vilarejo de Itira, a cerca de 19 km de Araçuaí. Foi a vila que serviu de cenário para a cidade fictícia de Kenoma, que aparece no filme.
Para esses convidados assistir ao filme tinha o atrativo especial do ineditismo. Acostumados à TV, não imaginavam que a tela de cinema fosse tão grande.
"É engraçado me ver lá, enorme", disse, após a projeção, Ana Rita Pereira dos Santos, 36, cinco filhos e algumas lágrimas mal disfarçadas nos olhos. O marido, embriagado, não queria que ela fosse assistir ao filme. Só no fim da tarde ela conseguiu convencê-lo: prometeu que voltava cedo.
A telefonista de Itira, Rosimeire Rodrigues Jardim, 31, considerou a história interessante, embora ache a máquina que aparece no filme "impossível de ser feita".
Ela faz, no filme, par com Luiz Gonzaga de Assis, 68, que aparece como o atendente do bar da cidade. Ele, um dos poucos que assistiram a filmes no antigo cinema da cidade, se resumiu a dizer que seria bom ter outros filmes sendo produzidos na cidade. "O desemprego é muito alto", diz.
A cidade de Araçuaí, com 34.379 habitantes, segundo o censo populacional de 1996, é a maior do vale do Jequitinhonha. O local vem sendo castigado pela pior seca dos últimos cinco anos e não vê chuva há pelo menos 11 meses.
No ano passado, as filmagens de "Kenoma" se transformaram num grande acontecimento e empregaram cerca de 130 pessoas na região. Na véspera da projeção, no dia 22, a equipe de produção foi homenageada com o "Forró Kenoma". Ninguém do grupo pagou pela cerveja.
Uma lembrança tornou-se monumento da cidade: a roda maior da máquina de moto-perpétuo que aparece no filme, com cerca de 5m de diâmetro, está exposta próxima à rodoviária e ao Mercado Municipal, onde aconteceu a projeção.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.