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Eco nega o "fim do livro'
MAURÍCIO SANTANA DIAS
de Buenos Aires
Na quinta-feira passada a cidade de Buenos Aires foi de
Umberto Eco. O autor de "A
Obra Aberta" e "O Nome da
Rosa" veio à Argentina inaugurar a sede portenha da universidade de Bolonha, onde leciona.
Pela manhã, numa entrevista
coletiva apinhada de jornalistas, Umberto Eco foi como
sempre irônico e espirituoso,
mas preferiu deixar que o reitor
da universidade fizesse as honras da casa.
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Pinochet
Indagado sobre a atual situação dos direitos humanos e a
detenção do general Pinochet,
o professor de Bolonha respondeu que este era "um caso complicado".
"Há as pessoas comuns, que
dizem: "Que beleza, prenderam
Pinochet!'. Depois, constatamos com tristeza que muitos,
na verdade, gostam do general.
Há ainda aqueles que alegam a
sua idade avançada, e acham
melhor que ele volte. De qualquer modo, foi importante que
o juiz espanhol tivesse lembrado os crimes cometidos por Pinochet, o que, se não chega a
fortalecer a justiça, fortalece a
moral", concluiu Eco.
Sua declaração foi reprisada
durante todo o dia pelas televisões locais.
˛
Encontros literários
À noite foi a vez da aula magna, proferida num teatro Coliseu lotado.
Poucos minutos antes da hora prevista para o início, uma
salva de palmas ecoou no teatro. Todos pensaram que Umberto Eco tivesse chegado, mas
na verdade as palmas se dirigiam para o escritor argentino
Ernesto Sábato, que se sentou
na primeira fila.
Logo depois chegou Eco,
também muito aplaudido, que
foi logo cumprimentar o seu
colega argentino e a viúva de
Jorge Luís Borges, Maria Kodama.
Como costuma acontecer na
Argentina, todo evento, qualquer que seja, termina se tornando também um evento político.
Quando anunciaram que a
cerimônia se atrasaria porque o
vice-presidente, Carlos Ruckauf, ainda estava a caminho,
as vaias não se fizeram esperar.
Depois de quase meia hora de
expectativa, falaram o cônsul e
o reitor italiano, seguidos pelo
prefeito de Buenos Aires e candidato à presidência em 1999,
Fernando de la Rúa -que foi
aplaudido.
Como nesse tipo de cerimônia as gafes também são muito
comuns, De la Rúa apresentou
com orgulho "o eminente professor, Prêmio Nobel...", ao que
foi secundado por Ruckauf,
"temos a honra de receber o
Prêmio Nobel...". Ora, Eco
nunca recebeu o Nobel.
˛
"O fim do livro"
Finalmente Eco subiu ao palco. Mexendo-se muito, misturando frases em inglês com referências latinas, francesas e
borgianas ("Pierre Menard",
"Funes, o Memorioso"), Eco
explicou com clareza e exemplos cômicos o que pensa sobre
o tal "fim do livro".
Para ele, os "livros de leitura",
aqueles que pegamos e lemos
do início ao fim, vão permanecer para sempre, porque "ainda
não inventaram nada melhor".
Já os "livros de consulta" serão
substituídos pelos hipertextos,
mais eficientes, econômicos e
-fundamental- menos espaçosos.
Então, "longa vida ao livro no
próximo milênio", disse entusiasmado Umberto Eco no encerramento da aula.
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