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Crítica - 18º Festival é Tudo Verdade
Longa resgata legado do cinema marginal de Ozualdo Candeias
Revisão privilegia as imagens dos próprios filmes do diretor, marcados pela liberdade e pela transgressão
O que dizer de Ozualdo Candeias? Que é um gênio do cinema? Sim, mas como podemos comprovar a suposta genialidade? Talvez o melhor caminho seja o seguido por Eugenio Puppo, em "Ozualdo Candeias e o Cinema".
O longa é uma das principais atrações do fim de semana no festival de documentários É Tudo Verdade. Melhor que entrevistar cabeças falantes entoando loas ao cineasta é mostrar suas próprias imagens, elogio à liberdade e à paixão cinematográfica que os filmes irradiam.
Candeias foi um dos maiores talentos do cinema brasileiro. É necessário que seja (re)descoberto, admirado ou rejeitado (por que não?) pelo maior número de pessoas.
Seus filmes de orçamento irrisório mostram a habilidade de um mestre. Bastava ligar a câmera e ele sabia exatamente para onde apontá-la.
Trechos de todos eles aparecem com generosidade no filme de Puppo, tendo por vezes depoimentos do próprio Candeias na trilha sonora.
"A Margem" (1967), o primeiro, inaugura o "cinema marginal" (muitos preferem o termo de Jairo Ferreira: "cinema de invenção"). Com "Meu Nome é Tonho" (1969), obra-prima, reinventa o faroeste.
"A Herança" (1971), o terceiro longa, transpõe "Hamlet" para o interior paulista, com David Cardoso e trilha sonora repleta de ruídos. Ofélia é negra e o momento "ser ou não ser" é encenado com caveira de boi. Transgressão pura.
Podemos destacar ainda "Zézero" (1974), um média que se encaixa bem na ideia de cinema libertário, e o censurado "A Opção ou As Rosas da Estrada" (1981), em que a estranheza dá o tom.
Longas de outros diretores também entram no jogo, numa contextualização necessária para entendermos alguns momentos importantes do cinema brasileiro. Como aquele, no início dos anos 1980, em que o sexo explícito invadiu as telas precipitando o fim de um tipo de indústria cinematográfica: a boca do lixo.
Candeias faleceu em 2007, e a maior parte de sua obra inexiste em formato digital. Seu último longa, "O Vigilante", de 1992, nem foi lançado nos cinemas. O gênio, afinal, tende a ficar à margem.