Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Ilustrada

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Gata de sete vidas

Após superar mais um problema de saúde, a cantora "indie" americana Cat Power planeja ler Proust e revela que gostaria de ser humorista

MARCEL VENTURA COLABORAÇÃO PARA A FOLHA,
DE NOVA YORK

Chan Marshall contempla incerta a mala puída com a qual em meia hora partirá de Nova York para Londres. Procura em meio a embalagens de pizza e bitucas de cigarros alguma coisa que nem sabe se perdeu: "O difícil nisso é esquecer coisas valiosas".

Não é possível saber se ela se refere a sair de um hotel ou se está falando da vida.

Chan Marshall, 41, conhecida como a cantora americana Cat Power, dá a volta por cima mais uma vez.

Desde o início da carreira, em 1994, ela enfrenta problemas de alcoolismo e chegou inclusive a cancelar toda uma turnê mundial em 2006.

O ano passado começou bem para ela, com o lançamento do nono álbum, "Sun", no qual misturou som eletrônico em seu folk influenciado por punk, jazz e soul.

Melancólica, depressiva, desbocada, a artista voltou a adiar uma nova série de shows por causa de um angioedema (reação alérgica que causa inchaço na derme, sob a pele). "Achei que fosse morrer", ela conta em entrevista à Folha.

Cat Power apresenta no Brasil três shows da adiada turnê de "Sun" (lançado em 2012), começando pelo Rio, neste sábado. Depois, segue para Recife e São Paulo.

Agora, ela diz que dorme entre oito e 12 horas por dia e planeja ler "Em Busca do Tempo Perdido", de Marcel Proust. Está contando os dias para chegar ao Brasil e lembrar que todos os palcos se tornam um lar quando recebem Cat Power.

-

Folha - As coisas saíram errado no ano passado e você teve de cancelar sua turnê. O que aconteceu exatamente?
Cat Power - Eu simplesmente desabei por causa do estresse, sabe? Meu disco chegou aos dez mais, mas comecei a ter problemas com a minha família e coisas assim, e tive um angioedema, com inchaços horríveis. Achei que fosse morrer.
Meus dois cardiologistas fizeram testes, ressonâncias, mas meu homeopata me disse que eu deveria parar de ouvir o que eles diziam e de tomar analgésicos.
Ele me disse que eu devia fazer meditação, e comecei a meditar, mas as coisas ficaram difíceis. É ruim quando existe um incêndio e você não sabe sua força, sua potência, e fica vendo as chamas, sem controle sobre isso, e não importa que você não esteja bebendo, não importa que esteja comendo bem -o incêndio vem do mesmo jeito.
Eu achei muitas vezes que fosse morrer, muitas vezes. Quando chegou o momento em que tive certeza de que sobreviveria, já tinha cancelado a turnê. E foi necessário, porque você precisa fazer muita coisa numa turnê, e eu mesma faço minhas coisas, sabe? É uma responsabilidade.

Você se sente especialmente solitária em turnê?
Claro, somos seres humanos, não? Tenho três cachorros, mas eles não viajam bem por muito tempo. Você sabe seus nomes?

Quais são?
Mona, Abuelo e Paloma.

Você vai levá-los na turnê?
Não. Eu perguntei uma ou duas vezes mas eles não responderam.

Quer dizer que você não vai dividir o Brasil com eles?
Pois é. O Brasil é maravilhoso! Sempre que acho que estou a ponto de enlouquecer, penso em morar no Rio, no topo de uma montanha, contemplando o mar.

Você não acha que é uma beleza óbvia demais?
Mesmo? É como Nova York com praia. Como a região central de Manhattan, mas com praia. Desta vez, vou me hospedar em um lugar na confluência de Copacabana com Ipanema.

E quanto a São Paulo?
São Paulo é como uma Cidade do México, não? Muito intensa. E eu amo a Cidade do México.

Você às vezes se sente deprimida?
Depende do que estiver acontecendo ao meu redor.

Quando você está no palco?
Claro, mas sinto como se estivéssemos todos juntos dividindo aquele espaço. Você vê que, nos meus shows, estamos todos igualmente por baixo. É interessante porque, na turnê de "The Greatest", eu pude ver as pessoas pela primeira vez.
Eu estava sóbria Sentia aquela responsabilidade e era fisicamente impossível para mim relaxar no palco, até que eu percebi que as pessoas não estavam lá para me julgar pelo meu físico.
Estavam lá para sorrir, e é por isso que eu sempre quis ser humorista, porque você sempre pode dizer a verdade se for comediante, enquanto em música as coisas são mais simbólicas.

Você ainda quer ser humorista?
Quero muito, sim.

Adorei seu quadro no site americano de humor Funny or Die (www.funnyordie.com).
Não foi tão bom porque eu estava interpretando a mim mesma e não a professora. Até improvisei, mas no fim tudo foi editado.

Você tentou fazer comédia stand-up ou algo assim?
Não, mas queria, lá por 2004 ou 2005. Há um lugar a que vou em Los Angeles, chamado Comedy Store. É uma sala grande, onde gente famosa do humor apresenta seus números, gente que você vê no YouTube.
Eles têm uma "noite de calouros", tipo na segunda ou terça-feira, e era o que eu queria tentar, mas acharam que eu estava louca. Eles, simplesmente, não deixaram.

Ainda resta alguma coisa de seu primeiro show no Clermont Lounge, em Atlanta, sua cidade natal?
Bem, era uma casa de strip, então, sim, continuo no palco mostrando os peitos e a bunda [risos]. Tudo continua igual. Hoje relaxo bem mais que naquela época, sou mais destemida, mais tudo... Mas ainda reconheço a pessoa que fui naqueles anos.

Anos de incerteza, não?
Bem, a verdade vem da incerteza. Ninguém vai compreender as coisas por você.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página