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'A voz do povo é soberana', diz Tony Ramos

Ator que encarna presidente da República em 'Os Últimos Dias de Getúlio' filmou a metros das manifestações no Rio

Ele diz que longa busca "encontrar a alma" de Getúlio e que não se pode esquecer faceta ditatorial do gaúcho

DO ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Numa pausa das filmagens de "Os Últimos Dias de Getúlio", no campo de pouso abandonado do Museu Aeroespacial, no Rio, Tony Ramos, 64, expressa sentimentos ambíguos em relação ao presidente controverso que ele encarna no longa-metragem de João Jardim.

O ator se lembra do dia em que sua mãe chorou a morte do político e diz que o filme "busca encontrar sua alma", mas enfatiza a necessidade de cultivar distanciamento crítico em relação ao Getúlio ditador e repressor do Estado Novo (1937-1945).

A produção teve cenas rodadas no Palácio do Catete (antiga sede do Executivo federal, onde o presidente cometeu suicídio em 1954), a metros de onde aconteciam os protestos populares semanas atrás. "A voz do povo nas manifestações é sublime, soberana e decisiva. Desde que não venha acompanhada de uma balbúrdia descontrolada, porque aí aproveitadores de plantão poderão se utilizar disso", afirma Tony.

Um dos protagonistas da franquia cômica "Se Eu Fosse Você", grande sucesso de bilheteria nacional, ele acha que investidores e produtores devem buscar mais do que o riso. "Não podemos querer tudo muito mastigado, em forma de clipe [...] Vão com calma ao cinema e pensem que estão indo por uma boa ideia."

Leia os principais trechos da entrevista.

(RODRIGO SALEM)

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Folha - Você tem alguma lembrança de Getúlio?
Tony Ramos - Para mim, é muito fácil lembrar da morte dele. Meu aniversário é em 25 de agosto, e ele morreu no dia 24. Recordo que minha avó estava preparando um bolo para comemorar meus seis anos em nossa casa no interior de São Paulo [Ourinhos], quando ela colocou a tigela abruptamente no forno a lenha: "Minha Nossa Senhora, morreu doutor Getúlio". Perguntei quem era. Ela me falou que era o presidente do Brasil. Depois, minha mãe veio do quarto, chorando. É uma memória marcante. Quando mamãe soube que eu ia fazer o filme, perguntou se eu lembrava daquele dia. Getúlio era um homem com uma popularidade enorme.

Mas há o lado dele ditador, repressor...
Sim, isso não anula o que ele fez como ditador. O distanciamento crítico eu sei tê-lo, e muito bem. Mas não estamos contando essa história. Vamos contar como esse homem, eleito pelo povo anos depois [de ter comandado um regime ditatorial], tem a oportunidade de rasgar a Constituição pela terceira vez e se recusa a fazê-lo. Queremos encontrar a alma dele.

E como foi filmar como Getúlio no Palácio do Catete, enquanto o Rio se via às voltas com as manifestações populares a poucos metros dali?
Emocionante. Foi uma das coincidências mais enlouquecidas da minha carreira. É sempre bem-vindo ter histórias políticas em países que passaram por grandes momentos de fragilidade democrática. Sou da época em que fazíamos teatro político... Quantas perseguições e medos nos atormentaram. A democracia fica frágil quando querem se intrometer na imprensa e na liberdade das palavras. Por isso, acredito nas manifestações populares para demonstrar as insatisfações mais generalizadas. Agora, quando vira uma grande bagunça no fim, é algo que precisa ser estudado. Onde é a provocação? São provocadores profissionais? A voz do povo nas manifestações é sublime, soberana e decisiva. Desde que não venha acompanhada de uma balbúrdia descontrolada, porque aí aproveitadores de plantão poderão se utilizar disso. A liberdade de expressão é a mais preciosa arma que o indivíduo possui.

É difícil ver um filme grande no Brasil com tons políticos.
Eu faço "Se Eu Fosse Você" como faço "Tempos de Paz". O cinema e os investidores não podem se preocupar apenas com a pergunta "É pra rir?". Nosso filme é para rir, chorar e ficar com o bumbum grudado na poltrona, porque virou um grande thriller. Adoraria saber que os patrocinadores falaram que gostaram da ideia de um cinema político e sociológico. Não podemos querer tudo muito mastigado, em forma de clipe. Hoje em dia, uma cena com mais de dois minutos é um problema. Vão com calma ao cinema e pensem que estão indo por uma boa ideia. Adoro Super-homem, sou um cinéfilo, mas outro dia estava revendo "Amarcord", que é o filme da minha vida, e fiquei extasiado. Há momentos de pura emoção, mas a família toda sorri com ele.

Haverá um terceiro "Se Eu Fosse Você"?
Não deve acontecer. Passou o tempo. A gente acha que precisa ser uma grande história, no momento certo. Há uma ideia de fazer um musical no teatro, mas não sei se poderei fazer.


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