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Crítica - Romance

Fuentes revigora trama surrada com eterno retorno de Nietzsche

Livro usa saída original para narrar trama sobre revolução na América Latina

NOEMI JAFFE ESPECIAL PARA A FOLHA

Em algum país, provavelmente hispano-americano, líderes revolucionários chefiam uma rebelião que, depois do sucesso, acaba levando-os a comandarem a execução uns dos outros, sempre alegando a defesa do povo.

O povo, essa entidade abstrata e ingovernável, adere ora a um ora a outro líder.

Enquanto isso, o governo deposto pela revolução arma secretamente um retorno ao poder, aproveitando-se da desordem gerada pelo novo regime no poder.

Em meio a isso, há histórias de amor, brigas familiares, interesses pessoais e taras patológicas que subjazem a tudo.

A qualquer leitor essa história soa não mais do que entediante, pela repetição que, de tão desgastada, parece independer de época ou país. Dificilmente uma trama como essa poderia atrair leitores mais atentos ou exigentes, que desprezariam esse retorno eterno do mesmo.

Mas é justamente a ideia aparentemente absurda do "eterno retorno" nietzschiano que está por trás desse enredo intencionalmente surrado e desinteressante. E é ninguém menos que o próprio Nietzsche que, em falas interpoladas, comenta a narrativa desse "déjà vu".

Conversando com um interlocutor misterioso, Federico, de sua sacada --daí o título desse romance póstumo de Carlos Fuentes-- questiona, de forma cifrada, os acontecimentos pessoais e coletivos de uma farsa política em algum país da América espanhola, provavelmente o México (mas poderia ser o Peru, a Bolívia, a Venezuela etc.)

Mas, além de Federico --o Nietzsche--, também participam dessa história um certo Dante (que tanto pode ser o poeta medieval como o Danton francês), Gala (a mulher de Dalí) e Dorian (da história de Oscar Wilde).

Esses personagens, ao lado de aristocratas decadentes, um jurista ético --mas pedófilo--, um operário fanático, um louco justiceiro e uma garota assassina, fazem com que aquela trama supostamente conhecida se transforme em uma interpretação desesperadamente mordaz do continente americano e da própria vida nos países "em desenvolvimento".

A teoria do eterno retorno se torna uma possibilidade e as tintas de surrealismo --na convivência desses personagens tão desencontrados-- torna-se não apenas possível, mas natural.

Federico, em sua real irrealidade, não cessa de nos perguntar: "Qual é o limite moral do crime?"; "Pode punir-se quem ajuda a um suicida?"; "Ao esquecer o passado você também esquece o presente?"; "Acha que seu nome é sua identidade?".

O leitor, perplexo, que tente responder.


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