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Quem vigia os vigilantes?

Em novos romances distópicos grandes corporações tomam o lugar de governos tirânicos como vilões

GUILHERME GENESTRETI DE SÃO PAULO

Governos tirânicos, daqueles que controlam o pensamento dos cidadãos ou mandam todos os livros à fogueira, já não assombram mais os escritores como antigamente.

No passado, foi esse o grande medo de autores como George Orwell (1903-1950) e Ray Bradbury (1920-2012). Mas na nova onda de romances distópicos, que imaginam o futuro da humanidade, o pesadelo vem sob a forma de grandes corporações.

Pode ser um gigante da tecnologia ao estilo Google/Facebook, que prega o fim do anonimato, como em "The Circle", de Dave Eggers, 43, lançado em outubro nos EUA.

Ou pode ser um conglomerado da engenharia genética que não só cura mas também cria doenças para garantir os lucros --caso da trilogia "MaddAddam", da canadense Margaret Atwood, 74.

O último volume da série saiu em setembro nos EUA; no Brasil já foram publicados os outros dois, "Oryx e Crake" (Rocco, R$ 46) e. "O Ano do Dilúvio" (Rocco, R$ 59).

O livro de Eggers (ed. Knopf, cerca de R$ 34, na Amazon), que deve ser lançado no Brasil ainda neste ano pela Companhia das Letras, narra a história de uma jovem que vai trabalhar na poderosa companhia O Círculo, que concentra rede social e serviços de busca na internet.

"Privacidade é roubo" é um dos slogans da empresa, que monitora a vida de todos os usuários de sua rede com pequenas câmeras e deixa dados pessoais expostos.

"O medo de perder a privacidade é antigo, já há um grão dele em 1984', de Orwell", diz o escritor Bráulio Tavares, pesquisador de literatura de ficção científica. "Mas ele não poderia imaginar o grau a que chegamos hoje com as redes sociais."

EMPRESA MODERNINHA

Eggers se recusou a comentar o livro, mas concedeu uma breve entrevista ao site de sua editora norte-americana.

"Muitas vezes eu pensava em algo que uma empresa como O Círculo poderia criar [...] e, então, acaba lendo a respeito dessa mesma invenção, ou até algo mais extremo, no dia seguinte", afirmou.

Na ocasião, ele negou fazer referência ao Google ou ao Facebook, apesar de o livro se passar numa corporação moderninha, cheia de jovens, no Vale do Silício.

Comparações com "1984" também não faltaram. A revista "New Yorker" apontou que o SeeChange, programa criado pelo Círculo para vigiar o mundo com minicâmeras, se assemelhava às teletelas monitoradas pela Polícia do Pensamento no livro de Orwell.

Os slogans da empresa imaginada por Eggers: "Privacidade é roubo", "segredos são mentiras" e "compartilhar é cuidar" também ecoam o tríptico "guerra é paz, liberdade é escravidão, ignorância é força", de "1984".

No universo criado por Atwood (ed. Nan A. Talese, cerca de R$ 42,50, na Amazon), a corporação chamada HelthWyzer tomou o lugar do próprio Estado após a disseminação de uma praga: ela mantém o próprio Exército e esmaga seus opositores.

Autor de livros de ficção científica, Roberto Causo crê que o papel de vilão das empresas tenha a ver com certo descrédito no livre mercado.

"A ausência do Estado na regulação da economia deu poder às empresas e levou a crises financeiras e acidentes ecológicos", afirma.

"Nisso surge nos escritores o medo de que as corporações subvertam a democracia e a economia domine a política."


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