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Crítica - Drama

Diretor mostra visão esgotada em 'Cães Errantes'

Tsai Ming-Liang filma família miserável com longos planos contemplativos que podem aborrecer espectador

CÁSSIO STARLING CARLOS CRÍTICO DA FOLHA

Após exibir seu décimo longa no último Festival de Veneza, no qual venceu o Grande Prêmio do Júri, o celebrado Tsai Ming-Liang, cineasta chinês de Taiwan, anunciou que pretende abandonar o cinema.

Este sentimento de fim, ou melhor, de beco sem saída, contamina cada um dos longos e longuíssimos planos de "Cães Errantes", como um sinal de esgotamento da visão de mundo e de cinema de Tsai.

O filme registra o cotidiano de um pai e seus dois filhos nas ruas, em espaços desabitados e lugares baldios de Taipé. O trabalho dele, de ficar em pé segurando placas com anúncios de empreendimentos imobiliários, mal se enquadra na categoria subemprego. As crianças sobrevivem recolhendo restos em supermercados.

Vivendo além do limite da miséria, os personagens nem permitem materializar o sentimento de denúncia que costuma interessar as plateias que se indignam com a injustiça enquanto mastigam confortavelmente guloseimas.

Tsai prefere filmá-los como zumbis, seres destituídos de vida, corpos ambulantes que vagam na metrópole, ruínas de uma ideia de progresso.

No lugar do pai, o ator Lee Kang-shen permanece como o eixo conceitual da obra de Tsai. Lee começou jovem nos primeiros filmes do cineasta e agora, já com mais de 40 anos, é o único elemento que sustenta a ideia de narrativa, no mais totalmente ausente.

É no corpo deste ator-fetiche, não na psicologia, que o filme projeta temas como dor, fome e vazio.

Filmar o vazio, porém, tornou-se um problema na obra de Tsai. A opacidade dos comportamentos e a escolha dos tempos mortos, adotada desde os primeiros filmes como forma de capturar algo próximo do nada, cristalizou-se num estilo, congelou-se em composições que só assombram pela beleza.

O que elas revelam, no entanto, é apenas um cineasta fascinado pelo próprio artifício que construiu, enredado na armadilha do próprio olhar e institucionalizado pelos júris dos festivais como autor de "radicalidade estética".

Ao espectador, resta permanecer hipnotizado por essas teias visuais, aborrecer-se infinitamente ou decidir que duas horas e dezoito minutos é tempo demais para ficar contemplando o nada.


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