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O que é, o que é?

Com ousadia, grana e perfil conservador, editora É intriga e movimenta filão de "livros cabeça"

Eduardo Anizelli/Folhapress
O editor e dono da É Realizações, Edson Filho, na sede da empresa, em São Paulo
O editor e dono da É Realizações, Edson Filho, na sede da empresa, em São Paulo

FABIO VICTOR
DE SÃO PAULO

O nome é tão diminuto quanto era há até outro dia sua penetração no universo editorial brasileiro. Mas a ousadia dos lançamentos mostra que a editora paulista É (ou É Realizações) tenta balançar o coreto no filão de obras de humanidades.

Com títulos de filosofia, teologia e antropologia -mas também literatura, cinema e teatro-, a É busca, segundo seu editor, Edson Filho, 50, publicar em português autores da "alta cultura".

O lance mais vistoso ocorreu em setembro passado, quando de uma só vez a É lançou 15 livros da Biblioteca René Girard, projeto que deve chegar a 60 volumes ligados ao filósofo francês em 2013.

O tributo a Girard -defensor do cristianismo e criador da "teoria mimética", segundo a qual a imitação do desejo alheio é a raiz da violência- segue uma lógica editorial. No catálogo da É predominam pensadores de viés conservador, entre os quais o espanhol Xavier Zubiri, o jesuíta canadense Bernard Lonergan e os americanos Gertrude Himmelfarb, Russel Kirk e irmã Miriam Joseph.

Edson Filho nega que trate-se de uma proposta ideológica. Diz que é, antes, uma cartada pragmática, uma vez que, opina, o nicho é dominado por autores marxistas.

"Procurei suprir uma lacuna que há no mercado, trazer para o debate autores importantes, mas que não são conhecidos no Brasil."

Rejeitando ser ele mesmo um conservador, conta que foi criticado por ter publicado o livro de um padre gay, James Alison ("Fé Além do Ressentimento").

DINHEIRO

O caso de Girard ilustra a capacidade de investimento da editora. Os livros foram lançados num seminário que trouxe ao Brasil intelectuais de várias partes do mundo.

O projeto gráfico da coleção e do encontro são de Alexandre Wollner, pioneiro do design moderno brasileiro.

Segundo Edson, o custo das iniciativas em torno de Girard foi de R$ 1,5 milhão. A É teve o apoio da fundação americana Imitatio, bancada pelo milionário Peter Thiel, cofundador do PayPal, investidor do Facebook e pupilo do pensador francês.

Mas, conta o editor, a Imitatio só entrou com R$ 200 mil -menos de 15% do total.

Em 2011, relata ele, os investimentos da empresa foram de R$ 6 milhões. Surge então a pergunta que intriga ultimamente o mercado: de onde vem o dinheiro da É?

Edson Filho é casado com Angela Zogbi de Oliveira, de uma rica família de empresários e banqueiros.

"O dinheiro dela ajuda, claro. Ela acredita no meu projeto e está junto comigo, senão eu não teria condições de investir a longo prazo."

Ele ressalva, porém, que sua proposta "não é filantrópica, é comercial" e diz que espera ter retorno em três anos. "Apostamos que vamos entrar nas universidades."

Até que este tempo chegue, há problemas.

Presidente da Fundação Gilberto Freyre e filha do sociólogo, Sonia Freyre elogia o apuro nas edições dos noves livros do pai publicados pela É, mas aponta deficiências na distribuição.

"Você não encontra os livros nas livrarias", diz.

Um editor que pede anonimato afirma que as livrarias não costumam absorver vários obras de um mesmo autor lançadas de uma só vez.

Entre os admiradores, está o professor de literatura da Universidade Estadual do Rio de Janeiro João Cezar de Castro Rocha, que se tornou colaborador da É (coordena a Biblioteca René Girard).

"A perspectiva única de combinar projeto editorial com a dimensão de pesquisa é o que me leva a trabalhar com Edson Filho."

Difusor de muitos dos autores publicados pela É, o filósofo Olavo de Carvalho foi parceiro fiel em outros tempos -publicou obras pela editora e deu cursos no espaço que ela mantém na Vila Mariana-, mas, segundo Edson, eles romperam por "problemas pessoais".

A reportagem não conseguiu falar com Carvalho, que está morando nos EUA.

GROTOWSKI E BARBA

Baiano de Andaraí, Edson Filho chegou a São Paulo com dez anos de idade. Estudou teatro na escola Macunaíma nos anos 70. Nos 80, teve aulas na Europa com o polonês Jerzy Grotowski (1933-1999) e o italiano Eugenio Barba.

De volta ao Brasil, dirigiu shows musicais -de Chico César e Vanessa da Mata.

A É Realizações surgiu em 1995 como espaço para cursos e palestras. A editora veio em 2000, publicando primeiro livros infantis e de saúde.

Em 2010 (30 livros lançados), começou a mudar o perfil e ampliar o investimento. Em 2011, publicou 80 títulos; para 2012 são planejados 130. "O que fizemos em dez anos estamos fazendo em um."

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