Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Ilustrada

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Crítica - Série

'Transparent' humaniza a questão de gênero

Produção da Amazon trata da transgeneridade sob uma necessária luz moderna, com mão suave de comédia

LAERTE COUTINHO CARTUNISTA DA FOLHA

Há uma família americana, gente bem de vida.

Pai e mãe separados, três rebentos já adultos: duas moças e um rapaz.

A mais jovem tem dificuldades de estabilidade financeira e profissional.

A irmã tem um casamento hétero, filhos e um passado homossexual que está reaflorando.

O moço é do show business e transa com garotas jovens da sua área.

A mãe casou-se com um homem que está em condições frágeis, mental e fisicamente.

Este pai, título do seriado "Transparent", que teve o primeiro episódio lançado pela Amazon em fevereiro, é transgênero. Vemos que superou a fase da autopercepção e aceitação e vive a grande dificuldade de se abrir para os filhos e para o mundo.

Tal dificuldade não será um enrosco narrativo --tudo vem à luz neste primeiro episódio.

Há, claro, muitas conexões e tensões envolvidas além das que dizem respeito diretamente a esse "trans-pai" --mas me agrada constatar o modo como o roteiro nos dispensa de um suspense desnecessário.

O tema --a questão de gênero-- não se banalizou, mas se humanizou.

Ele vem sendo mais e mais convocado para filmes, como em "Elvis & Madonna", "Vera", "Transamérica", "Tomboy", "Laurence Anyways" e "Aqui É o Meu Lugar". "Transparent" o faz num seriado, em registro de drama conduzido com mão suave de comédia.

MÃO PESADA

Há algum tempo só se ocupava dessa questão a comédia com mão pesada de farsa: homens se vestindo de mulher, mulheres se vestindo de homem, sempre em situações de tensão cômica, amplificando a ideia de ridículo e consagrando os comportamentos "normais".

De alguma forma, gays e lésbicas já haviam sido resgatados para o campo das narrativas "dignas", da compreensibilidade dramática.

Mas a transgeneridade precisava dessa luz moderna, sob a qual podemos, finalmente, perceber a realidade de pessoas vivendo a tensão de precisar esconder sua natureza das suas relações mais íntimas --filhos, pais, cônjuges, amigos; para não falar de colegas de trabalho e círculos sociais mais amplos.

É uma situação que está longe de ser excepcional; ao contrário, é frequente e secreta, lutando para se fazer reconhecer e derrotar o estigma social que a associa, na visão do fundamentalismo conservador, com a perversão e a doença.

"Transparent" conta histórias desse tempo em que tais sofrimentos podem deixar de ser inexoráveis e vidas podem deixar de ser opacas.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página