Parque de desdiversão
Folha visita Dismaland, a Disneylândia anarquista criada por Banksy; instalações vão até 27 de setembro
A melancólica e ininterrupta trilha sonora dos altos falantes da Dismaland deprime e atormenta os ouvidos e a cabeça. "Eu sou um imbecil", diz o balão negro de hélio vendido no parque.
Banksy, o misterioso e célebre artista de rua britânico, tem conseguido, além de repercussão internacional, provocar, enfadar e até divertir as 4.000 pessoas que visitam diariamente sua recém-lançada sátira subversiva da Disneylândia.
Os ingressos se esgotaram para os próximos oito dias –tudo vendido em minutos pela internet. Com muita sorte, foi possível comprar um para a última quarta (26).
A exibição vai até o dia 27/9 num local tenebroso, desnivelado, em meio a poças de água e ruínas de uma piscina pública abandonada em Weston-super-Mare, no litoral oeste da Inglaterra.
Foram quase três horas de viagem de trem de Londres até o local. Na fila de entrada está o estudante Sam Wales, 16, todo animado, ao lado do primo George, 17. "Minha mãe nadou nessa piscina entre os anos 60 e 70", conta.
Ele é da vizinha Bristol, cidade natal de Banksy, artista que nunca revelou sua identidade. "Mesmo para nós, em Bristol, é um mistério quem é ele", diz o estudante.
Com apoio de cerca de 60 artistas, entre eles o britânico Damien Hirst, Banksy apresenta algo contestador, grotesco e, depois de algumas horas de passeio, bem entediante.
O nome do parque faz trocadilho com "Dismal" (sombrio, em inglês) e, obviamente, Disneylândia. "É a nova atração mais decepcionante do Reino Unido", diz o slogan.
Com orelhas do Mickey e forçando uma cara fechada, o staff checa na entrada se burlamos as regras: são proibidas facas e tintas de spray.
Leva-se uns 40 minutos de fila só para conhecer o castelo da Cinderela, onde, num corredor com goteiras, uma TV velha de 14 polegadas transmite o clássico da bela e do príncipe encantado. Do lado de dentro, Cinderela está morta, com sua carruagem capotada e seis paparazzi registrando imagens da falecida.
Todo visitante pode tirar foto num fundo neutro e pagar por uma montagem dela em meio à cena que vitimou a pobre princesa.
Do lado de fora, um lago reproduz barcos de refugiados e uma patrulha, em alusão à crise imigratória da Europa.
O lance é pilotar, com uma direção, a patrulha que persegue e atira nas embarcações de miseráveis. Dois irmãos, de cinco e oito anos, se divertem no "brinquedo".
Duas idosas não param de rir ao pescar patos amarelos de plástico em um outro lago, poluído por óleo –"Não roubem os patos", avisa a placa.
"Venha pescar também, veja como ela [a idosa] está feliz", me diz, sem gritar, um 'orelhudo' depressivo do staff do parque. Fui um fiasco.
Um banco de mentira oferece empréstimos para crianças a juros de 5.000%.
Ao lado, duas das três filhas do casal irlandês Richard e Nicole Meere jogam minigolfe. Para atingir o buraco, a bolinha precisa superar galões de gasolina. "Achei importante trazer as meninas, pela mensagem", afirma a mãe.
TERROR
O parque de Banksy, artista que recentemente fez um trabalho de impacto em Gaza, após visita secreta à região, foi revelado no dia 20 e aberto ao público dois dias depois.
A Dismaland foi construída sob sigilo numa área de 10 mil m2, de frente para o mar. A versão para curiosos e funcionários contratados era a de que a área tinha sido alugada para um filme de terror.
Por um porta-voz, Banksy diz que o local faz parte de sua infância e que há seis meses decidiu montar o parque. Ao apresentar o projeto, alertou que não trata de histórias com final feliz, mas de um espaço anarquista para iniciantes.
"É um tipo diferente de um passeio em família. O conto de fadas acabou", informou.