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A invenção de Méliès

Diretor Martin Scorsese homenageia um dos pioneiros do cinema com seu primeiro filme 3D

Divulgação
Ben Kingsley como Méliès em 'A Invenção de Hugo Cabret
Ben Kingsley como Méliès em "A Invenção de Hugo Cabret"

VAGUINALDO MARINHEIRO
DE LONDRES

Martin Scorsese adora novidades, adora contar boas histórias e, principalmente, adora o cinema.

Em seu novo filme, "A Invenção de Hugo Cabret", que concorre a 11 Oscars e estreia hoje no Brasil, conseguiu unir tudo isso numa comovente homenagem a um dos precursores dessa arte, o francês Georges Méliès (1861-1938).

A novidade é o 3D, que o cineasta usa pela primeira vez. "O 3D é o futuro do cinema, mas é bom lembrar que ele vem lá do passado. O próprio Méliès já buscava algo parecido no início do século 20. Na verdade, há dois minutos de um dos seus filmes, 'Le Cake-Walk Infernal' [1903], filmados com duas câmeras simultaneamente, que já é um precursor da técnica. Ele caminhava para isso", disse Scorsese, durante entrevista à Folha no final do ano passado em Londres.

A boa história é a do próprio Méliès.

Ele era uma das pessoas que assistiram, no final do século 19, às primeiras projeções em Paris dos filmetes dos irmãos Auguste e Louis Lumière, que mostravam um trem em movimento.

As imagens assustaram alguns espectadores, mas encantaram Méliès -que, na época, atuava como mágico.

Ele comprou uma câmera, montou um estúdio e começou a filmar narrativas que criava e interpretava.

Lançou mais de 400 títulos, que misturavam magia, ficção científica, comédia e horror.

Fez sucesso até a eclosão da Primeira Guerra Mundial (1914), quando foi esquecido.

Ficou desiludido, queimou todos os seus cenários, figurinos e a maioria dos originais de seus filmes. E passou a viver anonimamente.

Para recontar essa história, Scorsese usou o livro de Brian Selznick, que tem o mesmo título do filme.

Selznick acrescentou ficção à realidade.

Criou um personagem, o próprio Hugo, um garoto órfão que vive na estação de trem Montparnasse, de Paris.

É ele que reencontra o velho cineasta, que escondia seu passado e mantinha uma lojinha de brinquedos na mesma estação. O garoto acaba sendo o responsável por seu redescobrimento, o que de fato aconteceu, pouco antes da morte de Méliès.

"É a recontagem do mito do velho exilado que é resgatado pelas mãos de uma criança pura", afirma Ben Kingsley, que interpreta Méliès na produção.

Ele conta que, no início das filmagens, recebeu de Scorsese uma caixa com vários filmes do francês.

"Eu já o conhecia, mas foi valioso rever os filmes e comparar com o que foi recriado agora, como seu estúdio de vidro em Paris", disse.

Kingsley, que já trabalhou com grandes diretores e ganhou o Oscar de ator por "Gandhi" (1982), não economiza elogios a Scorsese.

"Ele é um diretor seguro, que te deixa trabalhar. Quando diz 'corta', vem com comentários adoráveis, ajustes que apenas enriquecem seu trabalho. Os diretores inseguros querem te deixar também inseguro e pedem takes e mais takes", afirmou à Folha.

CHAVES DO CORAÇÃO

A história ficcional de Hugo também é cheia de dramaticidade. Desde o início do filme, o garoto abandonado tenta reconstruir um robô que era de seu pai, morto durante um incêndio.

A chave para a máquina funcionar, que está perdida, tem o formato de um coração. "É mais uma das metáforas sutis do filme", diz Kingsley.

"O coração do autômato precisa ser aberto com uma chave, assim como o coração de Méliès, que está fechado, amargurado, precisa que alguém o abra. E a chave é a mais inocente das crianças."

A frase é de Kingsley, mas bem poderia ser do Méliès redescoberto.

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