Crítica MPB

Familiar e estranho, CD tem pop perfeito e frescor poético

A poesia começa quando um tolo diz que o mar parece óleo, dizia o poeta italiano Cesare Pavese.

O prazer dessa relação misteriosa entre o sublime e o banal é uma das essências da criação artística.

No universo das canções, então, a infinitude de olhares sobre a realidade e suas sugestões poéticas depende simplesmente do observador.

Marina Wisnik já lançou um livro, mas é relativamente nova no mundo da música, tendo começado a compor há poucos anos.

Talvez daí nasça o frescor de sua abordagem para aquela relação entre o meio banal e o meio especial que transforma óleo em mar.

Nas 11 composições de seu primeiro álbum, "Na Rua Agora", a voz cotidiana evoca ideias de vento, céu, mar, manhãs, estrelas, estrada, espelhos, luzes lilases, como que buscando o indizível, o maior-que-a-vida.

As melodias fluidas e naturais, desenvolvidas com simplicidade e esperteza, se emolduram na produção, piano, teclados de Marcelo Jeneci e coprodução de Yuri Kalil.

Os arranjos seguem a simplicidade das canções e seus pequenos detalhes, com participação de músicos como Clayton Martin na bateria e Régis Damasceno no baixo (ambos do Cidadão Instigado), mais Jonas Tatit, Eric Rahal, Estevan Sinkowitz, Chico Salem, Ricardo Prado, Luque Barros, Thiago Pethit.

Com som limpo de violão, piano, teclados vintage, backing vocals, bateria sequinha, faixas como "Jardim de Inverno" e a canção-título têm sonoridade de pop ideal, Jeneci mostrando o mesmo talento de arredondar, adocicar, dinamizar que já esbanjava em seu disco solo.

Acústico, lúdico e algo melancólico, familiar e estranho, "Na Rua Agora" existe em algum lugar bem particular entre Rita Lee e Ná Ozzetti, com seu próprio som suave, letras diretas e certa ingenuidade de novo século, talvez afinal romantismo.