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Teatro

Cibele Forjaz discute identidade brasileira a partir da escravidão

Com a Cia. Livre, diretora estreia "A Travessia da Calunga Grande", que retrata viagem dentro de um navio negreiro

Para ela, montagem evidencia "como a estrutura escravista ainda está arraigada nas nossas relações"

GABRIELA MELLÃO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A diretora Cibele Forjaz pilota um navio movido a sangue que erra entre África e Brasil no Oceano Atlântico.

A embarcação é tema central de "A Travessia da Calunga Grande", novo espetáculo de sua Cia. Livre, cuja estreia ocorre em 9 de março no Sesc Pompeia, em São Paulo.

Também serve como metáfora para a formação do povo do país ao sintetizar a história do tráfico de escravos, que acabou por gerar a identidade mestiça do brasileiro.

Para a dramaturga Gabriela Amaral Almeida, o navio representa a perpetuação dos crimes da escravidão numa sociedade que prega a falsa conciliação das diferenças.

Ao redor do barco, há um espelho d'água que representa o mar. Tem o formato de um olho, símbolo da trajetória do anti-herói de "Édipo Rei", clássico de Sófocles.

Para Forjaz, a tragédia e as matrizes da criação do Brasil estão relacionadas. Segundo ela, a busca por identidade (discussão central do mito de Édipo) é também a grande questão do brasileiro. "Como se pensa a identidade de um país composto por diferenças?", pergunta.

Por desconhecer sua ascendência, Édipo mata o pai e se casa com a mãe. Ao descobrir sua real identidade, fura seus olhos.

Enquanto viajam rumo ao Brasil no navio negreiro Calunga Grande (mar e morte em língua bantu), os personagens da peça de Forjaz têm jornadas similares à empreendida por Édipo. Como ele, perdem suas raízes. Alguns de forma voluntária, como o Capitão Tanto Faz McCarty e Nora, corrompidos por ganância e sede de poder para ascenderem socialmente.

Os demais sofrem um corte involuntário ao serem vendidos como escravos. "Os escravos eram desumanizados, despojados de tudo, viravam objetos", diz Lucia Romano, atriz que interpreta Nora.

Forjaz prepara a viagem de "A Travessia" há sete anos. Começou a planejá-la com a pesquisa sobre mitos, morte e renascimento na cultura brasileira, que resultou nas peças "Vem Vai, o Caminho dos Mortos" (2007) e "Raptada pelo Raio" (2009). Ao analisar a gênese africana, segue seu trabalho de recuperação da memória brasileira.

Define "A Travessia da Calunga Grande" como o espetáculo mais amado e difícil dos 11 anos de seu grupo, pela abordagem ácida que faz do preconceito racial e por evidenciar "como a estrutura escravista ainda está arraigada nas nossas relações humanas de hoje".

A TRAVESSIA DA CALUNGA GRANDE
QUANDO qui. a sáb., às 20h30, e dom., às 18h30; de 9/3 a 29/4
ONDE Sesc Pompeia (r. Clélia, 93; tel. 0/xx/11/3871-7700)
QUANTO de R$ 4 a R$ 16
CLASSIFICAÇÃO 14 anos

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