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Porto seguro

O diretor Aki Kaurismäki deixa o pessimismo de lado em fábula sobre a imigração clandestina na Europa

Divulgação
André Wilms (à esq.) e Blondin Miguel em cena do filme "O Porto"
André Wilms (à esq.) e Blondin Miguel em cena do filme "O Porto"

ANA PAULA SOUSA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O diretor finlandês Aki Kaurismäki, conhecido pelo sarcasmo e pelo pessimismo, anda mais sorridente. Na tela e fora dela.

"O Porto", selecionado para o Festival de Cannes em 2011 e eleito o melhor filme do evento pela crítica internacional, é uma fábula deliciosamente "démodé".

E Kaurismäki, que tem fama de resmungão, se mostrou gentil e divertido na entrevista concedida à Folha na semana passada.

"Todo segundo filme tem um final feliz. Isso é matemático", ironiza.

Kaurismäki dirigiu mais de dez longas. Mas "O Porto" é seu segundo filme falado em francês -o primeiro foi "La Vie de Bohème" [a vida de Bohemia], de 1992.

O retorno ao país se deu, basicamente, porque o cineasta caiu de amores por uma cidade chamada Le Havre, na Normandia.

O amor foi tal que, no original, o filme se chama "Le Havre". "Quando me perguntam porque escolhi Havre, gosto de dar a mesma reposta que Edmund Hillary dava quando perguntavam porque escalou o Everest: 'Porque ele estava lá'."

Mas não foi só isso. "A história poderia se passar em qualquer cidade portuária da Europa. Atravessei a costa toda, da Itália até Havre, atrás de uma locação", diz.

Em Le Havre, encontrou uma "estranha beleza" e uma "linda luz branca". "Para mim, a cidade simboliza a resistência", diz. Mais ou menos como seu filme.

REFUGIADOS

"O Porto" é uma discreta nota de resistência no cinema contemporâneo.

Os planos são quase todos fixos, os personagens se movem sem pressa e não há diálogos "espertos" nessa história bordada com singeleza chapliniana.

"A questão dos refugiados é uma vergonha para a Europa, sobretudo porque se trata de um problema pós-colonial, ou seja, ocasionado por nós", afirma.

"Mas, sabendo que a maioria das pessoas vai ao cinema para relaxar, não queria dar lições de política", diz, para justificar o tom leve, distante da desesperança de "O Homem sem Passado" (2002) e "Luzes na Escuridão" (2006).

Apesar de tocar em temas duros, como a imigração clandestina, a pobreza e o câncer, "O Porto" é um filme ao qual assistimos com um sorriso no rosto.

Impossível resistir ao charme de Marcel Marx (André Wilms), o escritor tornado engraxate que, de repente, se vê às voltas com um refugiado africano que chega a Havre achando estar em Londres.

Apesar da recepção quase unânime, o filme, indicado para representar a Finlândia no Oscar deste ano, não levou o prêmio de Hollywood.

"Graças a Deus!", rebate o diretor, que faltou à cerimônia quando concorreu por "O Homem sem Passado".

Sim, mesmo de bom humor, Kaurismäki não resiste a uma ou outra alfinetada -como a que reservou à pergunta sobre o Brasil, país fetiche de seu irmão Mika, que também é cineasta.

"Olha, devo confessar que não sou o maior fã das telenovelas brasileiras, mas, claro, fico feliz de ver que vocês estão crescendo e progredindo", disse ele.

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