Texto Anterior
|
Próximo Texto
| Índice | Comunicar Erros
Crítica / Ensaio D.H. Lawrence analisa os tormentos da literatura americana Livro sobre autores como Whitman, Melville e Poe reflete a singularidade histórica e os dilemas dos EUA ALCINO LEITE NETOARTICULISTA DA FOLHA Nas profundezas do Novo México, nos EUA, o escritor britânico D.H. Lawrence (1885-1930) adquiriu a única propriedade que teve em vida, um "rancho" de cerca de 650 m². Sem um tostão, ofereceu como pagamento o manuscrito de um de seus livros mais célebres, "Filhos e Amantes" (1913). Viveu pouco tempo no lugar. Tuberculoso, voltou à Europa e morreu em Vence (França), em 1930, aos 44 anos. Durante a estadia nos EUA, entre 1922 e 1925, escreveu a obra-prima "A Serpente Emplumada" (1926) e os extraordinários "Estudos sobre a Literatura Clássica Americana" (1923), que nas últimas décadas voltaram a chamar a atenção de intelectuais, inclusive Gilles Deleuze e Harold Bloom. O livro poderia se chamar "Estudos Sobre a América à Luz da Literatura Clássica", pois ele é também um pretexto para o escritor-pensador refletir sobre a singularidade histórica dos EUA. A reflexão de Lawrence é um tanto tortuosa, mas talvez possa ser resumida assim: ele vê os EUA como um país atormentado pelas exigências de um ideal civilizatório de base cristã e romântica, que pretende abolir as contradições da natureza humana. Ao tentar criar um novo homem, arrisca a destruir a vida. "A democracia americana sempre foi uma forma de autoaniquilição", escreve. Passa por aí a sua leitura de Benjamin Franklin, St. John de Crèvecoeur, Fenimore Cooper, Edgar Poe, Nathaniel Hawthorne, Richard Henry Dana, Herman Melville e Walt Whitman -todos eles, para Lawrence, divididos entre o idealismo próprio da cultura americana e a percepção "da verdadeira alma humana". Hoje, estes autores reinam no cânone literário, mas Lawrence, em 1923, trata-os de igual para igual. Diz que Franklin construiu o "primeiro simulacro do americano sabidinho". Critica o estilo "apelativo" de Poe. E chama Melville de "burlesco" e "sentencioso". Ao mesmo tempo, lança às alturas a obra deles. A análise de "A Letra Escarlate" é um desafio à atual leitura feminista, por enfatizar a função "diabólica" da mulher no livro de Hawthorne. Os textos sobre Melville e Whitman devem ser lidos de joelhos: são certamente os mais belos já escritos sobre os dois escritores. Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |