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Amigo diz que perfeccionismo foi razão para parar

EDUARDO SIMANTOB
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Amigo de Douglas Sirk, o artista Matthias Brunner recebeu o acervo do cineasta após a morte dele, em 1987.

Ele criou, com dinheiro da mulher do diretor, Hilde, uma fundação para organizar esse arquivo, que contém cartas, manuscritos, fotos e bastidores de produções.

À Folha, de Zurique (Suíça), ele fala sobre a valorização do cineasta e o motivo de ele ter parado de filmar.

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Folha - Como vocês dois se conheceram?
Matthias Brunner - Foi nos anos 1970, em 1974 se não me engano, no Festival de Locarno. Ele e a mulher, Hilde, frequentavam o evento incógnitos, sem credenciamento. Logo comecei a preparar uma retrospectiva da obra dele e começamos a nos encontrar com frequência em Zurique.

Hollywood levou mais tempo do que a Europa para apreciar a obra de Sirk?
Sim, até porque Sirk deixou lá uma imagem de diretor caprichoso. Para Hollywood, a obra de Sirk era considerada como melodramas para as tardes das donas de casa.

Sirk expressou seus rancores em relação a Hollywood?
Não, jamais. Tinha dezenas de motivos para reclamar de sua experiência nos EUA. O sistema abusou dele e nem o remunerou direito.
Fez um sucesso após outro para a Universal, e eles, em algumas situações, pagaram-no com ações da empresa. Quando deixou o estúdio, achava que algum gênio iria tocar a Universal, mas veio a crise dos anos 1960. O que Sirk havia guardado não deu nem para sustentar sua casa. Isso o incomodava, mas ele não se deixava amargar.

Ele comentava sobre seu retorno à Europa?
Dizia-se que ele voltou porque, em Hollywood, estava no fim de suas forças. Mas Fassbinder me disse, e outra pessoa confirmou, que ele tinha outra mulher nos EUA, alguém que trabalhava na produção de seus filmes. Por isso Hilde quis tirá-lo de lá. Mas, vai saber, essa história até hoje não foi provada.

Você tem nos arquivos muitos manuscritos originais. Sirk chegou a publicar algo?
Nada. Não tinha nenhuma ambição literária. Escrever era uma coisa pessoal, uma satisfação para a alma. Os manuscritos estão bem crus.

Como foi que esse material acabou em suas mãos?
Eu era tão fã dele que, toda vez que ia a Hollywood, comprava qualquer memorabilia sobre Sirk. Um dia eles me perguntaram se não queria abrir uma Fundação Douglas Sirk. Isso foi uns dois anos antes da morte de Sirk.

Alguma vez discutiu as razões de haver parado de filmar?
Sim. O estúdio o espremia tanto, Sirk realizava de dois a três filmes por ano Se ele fosse um [Jean-Luc] Godard, filmando de improviso, tudo bem. Mas Sirk era um perfeccionista. Assim, em um certo momento, se deu conta de que estava exausto.

Ele falava sobre a Alemanha?
Sempre. A guerra foi a pior coisa que aconteceu na sua vida, especialmente porque seu filho, que foi mandado para o front, morreu em combate. Sua primeira mulher era nazista e, quando eles se separaram, seu filho também se tornou um nazista fervoroso. Sirk teve de acompanhar o crescimento do filho por meio dos filmes de propaganda nazista. Assistia a esses filmes para ter uma ideia de como seu filho se parecia. Era um pesadelo.

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