Texto Anterior
|
Próximo Texto
| Índice | Comunicar Erros
Crítica / Antologia Livros desconstroem a mítica em torno de Florbela Espanca Lançamentos reúnem cartas e trechos de diários, que revelam identidade problemática de poeta portuguesa NOEMI JAFFEESPECIAL PARA A FOLHA "Um ser de suprema originalidade, tendo o orgulho por norma e a audácia por lei" e "uma estranha figura de devaneadora desdenhosa". Nas palavras de quem conheceu Florbela Espanca um ano antes de seu suicídio, em 1929, essas são definições precisas da personalidade que se revela em "Afinado Desconcerto" e "Sempre Tua". Mais do que a poesia desse mito da literatura portuguesa, é a identidade problemática de Florbela que se estuda em cartas, contos e trechos de diário da poeta, com texto extenso e rigoroso por Maria Lúcia dal Farra. "A via de perscrutação lírica de uma subjetividade sagrada pelo signo saturnino, para a singularidade maldita" é a síntese da jornada de Florbela, em cujas cartas se desdobram três casamentos, divórcios contra tudo e todos, e relacionamento afetuoso com pai e irmão, cuja morte precoce só faz aprofundar o sofrimento da autora. Uma mulher sedutoramente contraditória, em que se fundem um pathos "fin de siècle", maldito e vago a atitudes modernas de autonomia feminista e liberdade erótica. Mas, embora os dois livros permitam ao leitor comum o reconhecimento vertical de uma mulher em tudo única -no desafio aos costumes conjugais, na inquietude emocional e literária, e no interesse político-, ainda assim, trata-se de volumes mais voltados a estudiosos. É justamente o nível de detalhamento do texto e sua linguagem "barroquizante" que travam a fluência da leitura. Talvez o que se extraia de mais curioso seja a possibilidade de desconstrução do mito, pois, a partir das cartas, o leitor percebe sua postura independente, a trajetória que a levaria ao suicídio e, à posterior rejeição de suas obras pelo governo salazarista, fatos que contribuíram para a mitologia sobre a autora. Se brasileiro conhece quase só o aspecto francês e masculino da literatura simbolista, impressionista e quase patologicamente orientada para a morte,é interessante conhecer o lado pessoal de uma mulher com essas mesmas características, sobretudo em língua portuguesa. Afinal há, em nossa língua, na linguagem poética da dor e da morte, muito mais do que Fernando Pessoa. Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |