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Crítica drama

Longa fica a léguas do melhor Polanski

Em "Deus da Carnificina", que retrata conflito entre dois casais, diretor polonês repisa o já sabido

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

Já faz algum tempo que Roman Polanski esqueceu seus vampiros e anticristos. Esqueceu também suas ninfetas, suas Tess...

Tornou-se um diretor de filmes "de assunto". Um deles versava sobre sua própria experiência de menino judeu e polonês na Segunda Guerra. "O Pianista" (2002) era filmado com uma distância de quem parecia não ter nada a ver com o assunto.

Depois vieram as adaptações teatrais ou literárias, de que "Deus da Carnificina" é o mais recente exemplar, após "Oliver Twist" (2005) e "O Escritor Fantasma" (2010).

Polanski continua um diretor competente. No entanto, parece o escritor fantasma (o "ghost writer", entenda-se) de si mesmo.

Também o material de origem parece competente: a peça da francesa Yasmina Reza, adaptada por ela própria para o cinema, reúne dois casais. No filme, a ação se passa em Nova York, onde, em um parque, um menino agrediu um outro com um bastão.

Na peça, há os pais de um e de outro. Os pais do agredido são Jodie Foster e John C. Reilly. Os do agressor, Christoph Waltz e Kate Winslet. Difícil pedir mais de um elenco.

A ação se passa no apartamento, e o filme evita ocultar sua origem teatral: não tenta se passar pelo que não é.

Quando a ação começa, temos dois casais um tanto tensos, porém dispostos a resolver em bons termos as desavenças entre os rebentos, assumindo responsabilidades, direitos e deveres. A polidez marca esse momento.

Mas a tensão no ar já prenuncia o que virá: sob a capa de polidez, existem as divergências, sob as divergências, os conflitos que não deixarão de eclodir, como se os personagens -no que lembram muito a dramaturgia americana de Tennessee Williams, Albee e outros- precisassem se desnudar para que a verdade enfim aparecesse.

A verdade de Tennessee Williams e outros (no cinema: Kazan, certo Mankiewicz etc.) podia ser uma catarse libertadora. A de "Deus da Carnificina", não: a linguagem nos enreda. Ela é que nos conduz ao caminho inverso: da conversa civilizada à destruição.

É possível que, como queria Freud, a civilização seja, em si, mal-estar. Mas, dessa descoberta original ao filme de Polanski, existe um mar de conforto: trata-se de constatar o constatado, de conhecer o conhecido, de repisar o já sabido.

O que sobra? Um filme curto, de visão agradável, em que Polanski confia aos atores o essencial (no que tem razão, aliás). Um filme divertido, enfim, algumas léguas acima da rastejante média que o cinema comercial hoje nos proporciona.

Um filme, porém, confortável, burocrático, léguas abaixo do que já foi o melhor Polanski ou do que seja o bom cinema contemporâneo.

DEUS DA CARNIFICINA
DIREÇÃO Roman Polanski
PRODUÇÃO EUA, 2011
ONDE Cine Livraria Cultura, Espaço Unibanco Pompeia e circuito
CLASSIFICAÇÃO 18 anos
AVALIAÇÃO regular

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