A voz do morro

	Cecilia Acioli/Folhapress
	Sérgio Ricardo, 80, que monta peça no Vidigal, onde mora

Sérgio Ricardo chega hoje aos 80 anos e os comemora nos palcos de teatro.

Assim, ele -que é músico, escritor, cineasta e pintor- reitera sua versatilidade, abafada pelo episódio que o eternizaria: o rompante em que, impedido pelo público de apresentar "Beto Bom de Bola" no Festival da Record em 1967, quebrou seu violão.

Agora, assina texto e direção musical de "Bandeira de Retalhos", peça que acaba de estrear na favela do Vidigal, no Rio, encenada pelo grupo Nós do Morro, sob direção de Guti Fraga, Zezzé Silva e Luis Paulo Corrêa e Castro.

A montagem revisita a luta do Vidigal contra uma tentativa de despejo nos anos 70.

Naquele tempo, Sérgio Ricardo vivia em um barraco na favela, que foi sacudida pela ameaça de remoção. Em plena ditadura militar, a história parecia se encaminhar para o despejo da comunidade, não fosse a campanha dos moradores ganhar apoio em parte da sociedade civil.

"[O advogado] Sobral Pinto veio defender a nossa causa, o bispo entrou na história, os deputados entraram na história", lembra Sérgio Ricardo em entrevista à Folha após um dos últimos ensaios da peça antes da estreia.

"No fim de tudo, ainda o papa veio aqui entregar um anel em comemoração à nossa virtude de ter resistido num momento cruel da ditadura e vencido. Acabamos todos aqui proprietários de seus pedacinhos de terra", diz.

Para arrecadar dinheiro para construir as casas no morro, artistas como Chico Buarque participaram do show "Tijolo por Tijolo", concebido por Sérgio Ricardo.

"A história comoveu a cidade, e eu resolvi transformar numa peça. Fiz um trabalho musical em cima desse drama da remoção e parece que está dando certo, as coisas estão ficando bonitas."