Índice geral Ilustrada
Ilustrada
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Crítica teatro

Dramatização pobre não turva exímia encenação do Vertigem

"Bom Retiro 958 Metros" leva espectadores por locais do bairro paulistano

Há um impasse nos rumos que o grupo pode tomar doravante

LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA

Drama social ou instalação urbana? "Bom Retiro 958 Metros" parece dividido entre o desejo de abandonar o teatro por novas formas artísticas e a missão de dramatizar a realidade de um bairro paulistano.

O espetáculo do Vertigem parte de pesquisa sobre o Bom Retiro, suas ruas repletas de confecções e sua história de acolhimento a minorias -primeiro judeus e italianos, depois os coreanos e, hoje, bolivianos.

O diretor Antônio Araújo confiou a dramaturgia ao escritor Joca Reiners Terron. O resultado acirrou tensão, histórica no grupo, entre a apropriação poética dos espaços em bruto e a pulsão de narrar dos dramaturgos convidados.

Desta vez a exímia encenação, com virtuosa habilidade de servir-se da realidade achada, alterna situações de forte impacto visual com pobres dramatizações pontuais, em que personagens alegóricos apresentam-se verbalmente.

Catadores de lixo, consumidores vorazes, viciados em crack, faxineiras noturnas e manequins falantes conduzem o público, primeiro pelos corredores de um centro de compras e depois por ruas vazias. O realismo das falas desses seres ficcionais os aproxima de clichês e os banaliza.

A improdutiva dramatização sustenta-se em soluções geniais da matéria espetacular, como os postes de luz maquinados com tampas, que permitem a Guilherme Bonfanti desenhar na rua uma iluminação singular: estabelece escuridões, define focos e favorece as diversas projeções que ocorrem a partir de figuras híbridas, os homens-projetores.

Há também uma conquista técnica, com a perfeita sonorização de todo o trajeto, desenhada por Kako Guirado por meio de caixas de som móveis, que criam a ambiência musical e garantem a audição de tudo que é dito pelos atores.

A hesitação entre tornar-se "arte contemporânea" e manter o compromisso com o teatro dramático volta a evidenciar-se nas cenas finais, que ocorrem no abandonado Teatro Taib. Os escombros de uma antiga casa de espetáculos tornam-se molduras para cenas de melodrama, em vez de servirem à enunciação poética do próprio espaço

As dezenas de artistas e técnicos do Vertigem, responsáveis pela realização, merecem justas homenagens por mais esse feito. Não é possível, no entanto, desconhecer que há um impasse nos rumos que o grupo pode tomar doravante.

BOM RETIRO 958 METROS
QUANDO de qui. a sáb., às 21h, e dom., às 19h; até 30/9
ONDE Oficina Cultural Oswald de Andrade (r. Três Rios, 363, tel. 0/xx/11/3255-2713)
QUANTO R$ 30
CLASSIFICAÇÃO 16 anos
AVALIAÇÃO bom

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.