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Música

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Em novo disco, Tom Zé estuda as origens remotas do tropicalismo

Compositor faz tese complexa, mas inteligível, sobre o movimento liderado por Gil e Caetano

Álbum de canções inéditas tem Emicida, Washington, Mallu Magalhães, Pélico e Rodrigo Amarante

Adriano Vizoni/Folhapress
O compositor e cantor Tom Zé, em seu apartamento no bairro de Perdizes (SP)
O compositor e cantor Tom Zé, em seu apartamento no bairro de Perdizes (SP)

LUCAS NOBILE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

"O que faz o artista trabalhar é o incômodo. É como a ostra, que, durante anos, é incomodada por uma pedrinha, e dela faz uma pérola."

Mesmo com excelente memória, Tom Zé não se lembra ao certo se ouviu tal frase de Hans-Joachim Koellreutter ou de Ernest Widmer, seus professores na Faculdade de Música da Universidade Federal da Bahia, na qual ele ingressou, em primeiro lugar, em 1964.

No fim das contas, o que vale é que as palavras são uma tradução exata da incansável figura criativa do compositor e cantor baiano de Irará, que, mais de quatro décadas depois de ser um dos artífices do tropicalismo, dá agora sua versão sobre o movimento com o disco "Tropicália Lixo Lógico".

Com lançamento marcado para o dia 30 de julho, no Circo Voador, no Rio -e em agosto, em São Paulo, sem data e local definidos-, o trabalho sairá em CD e vinil.

"O projeto de um disco que falasse desse assunto [tropicália] já existia há anos, mas eu tinha receio de me meter nessa tarefa. Finalmente deu coragem de ter medo", diz o compositor.

Tom Zé elaborou uma complexa tese com um sem fim de referências que vão da Escola de Sagres -reunião de navegadores portugueses do séc. 15- a canções provençais, trovadores e culturas árabe, celta, assíria e egípcia.

O disco fala de alumbramentos e oralidade nos primeiros estágios do conhecimento de crianças de até dois anos, que ele chama de "analfatóteles na creche tropical".

Por volta dos sete, elas são apresentadas à lógica de Aristóteles. A soma disso com todo o conhecimento "virgem" anterior constitui o que Tom Zé batiza de "lixo lógico", que ficara isolado no "limbo do hipotálamo" dos protagonistas da tropicália, Gil e Caetano, durante anos.

No fim da década de 1960, inspirados pela efervescência de artistas -como Zé Celso, Hélio Oiticica, José Agripino de Paula, a retomada de conceitos de Oswald Andrade, Rita Lee, Os Mutantes e o rico momento do rock internacional (chamados por Tom Zé de "gatilho disparador")-, Caetano e Gil resgatam o adormecido "lixo lógico" e deflagram o tropicalismo.

PARTICIPAÇÕES

Aos 75 anos, sempre em busca de renovação, Tom Zé apresenta 16 temas inéditos -entre eles "Navegador de Canções", composto em 1972-, com participações de Emicida, Mallu Magalhães, Rodrigo Amarante, Pélico e do jovem músico pernambucano Washington.

"O primeiro encontro foi com Mallu. Fiz meia dúzia de músicas mais fluentes. Estava feita a parte que sempre preocupou o tropicalismo, de canções cantáveis e populares", diz Tom Zé.

Alguns temas servem para justificar a tese de Tom Zé, como "Apocalipsom A: O Fim no Palco do Começo" e "Apocalipsom B: O Começo no Palco do Fim", ambas com Emicida.

Além dessas, "Tropicalea Jacta Est", com Mallu, "Marcha-Enredo da Creche Tropical" e "Tropicália Lixo Lógico", com Washington, descoberto por Tom Zé em encontro com um vendedor de redes de seu bairro, Perdizes, em São Paulo, onde vive.

"Ele me disse: 'Eu tenho um filho que é cantor'. Eu pedi um CD, escutei e mandei o dinheiro da passagem pra ele vir gravar comigo."

Tom Zé não tenta reproduzir a sonoridade e a estética de discos do movimento tropicalista. O álbum traz canções leves, que falam de amor e inspirações cotidianas, como "O Motobói e Maria Clara", com Mallu, "Amarração do Amor", "Jucaju" e "De-De-Dei Xá-Xá-Xá", com Pélico.

Ainda há espaço para "Debaixo da Marquise do Banco Central", que relata o romance entre dois moradores de rua; "A Terra, Meus Filhos", "Aviso aos Passageiros", "Não Tenha Ódio no Verão", "Capitais e Tais" e "NYC Subway Poetry Department", com Rodrigo Amarante, inspirada em uma frase repetida pelo sistema de som do metrô de Nova York.

"Quando eu disse: 'Eu tenho canções cantáveis em minha mão, puxa, podia me aventurar na ideia do lixo lógico, da creche tropical'. Aí, finalmente eu entrei nesse corredor de desespero e pavor do qual saí com esse disco nos dentes."

TROPICÁLIA LIXO LÓGICO
ARTISTA Tom Zé
GRAVADORA Independente/Natura Musical
QUANTO R$ 20 (CD) e R$ 60 (vinil)

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