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Crítica drama

'Estamira' põe espectador em estado alterado de consciência

Mais do que encenação, peça sobre catadora de lixo é um acontecimento

Atriz e diretora criam juntas dramaturgia original, que é apresentada em circunstâncias muito especiais

CRÍTICO DA FOLHA

Poética da loucura. "Estamira, Beira do Mundo" é singular como espetáculo e excepcional como realização. Mais do que encenação sobre alguém ou algum tema, é um acontecimento teatral que coloca suas testemunhas em estado alterado de consciência.

Não há milagre nesse feito da atriz Dani Barros e de sua parceira Beatriz Sayad, que a dirige na jornada. As duas criam juntas uma dramaturgia original, que é apresentada por Barros em circunstâncias muito especiais.

O ponto de partida é o documentário de Marcos Prado, de 2004, que revelou ao mundo a história real de Dona Estamira. Catadora de lixo sexagenária e considerada doente mental crônica, ela trabalhou por 20 anos no lixão do Jardim Gramacho, no Rio.

O filme amealhou vários prêmios internacionais e teve no desempenho de Estamira seu principal trunfo.

Seu discurso desconexo, mas de alta intensidade lírica, e a vitalidade com que o apresenta venceram qualquer preconceito contra sua suposta insanidade.

Dani Barros chegou a conhecer Estamira antes de sua morte, em 2011.

Mas o estalo para arriscar-se na montagem desse solo veio de sua própria história e da triste experiência de ter tido uma mãe com depressão crônica, que sofreu diversas internações psiquiátricas.

É no cruzamento, no corpo e na alma da atriz, dessas duas existências sofridas que se produz o fenômeno a destacar.

Como se alternam na fala de Barros, numa flutuação sutil, as vozes de Estamira, cujo discurso no filme ela resgata, e a sua própria, narrando o enlouquecimento da mãe, configura-se uma situação fronteiriça entre o documental e o ficcional, entre a vida real de duas mulheres sofridas e a sua evocação dramática.

A hesitação entre os registros gera uma tensão virtuosa, que se intensifica ainda mais pelo trabalho extraordinário da intérprete.

Esta oscila entre expor, em carne viva, sua saga pessoal e deixar-se possuir por Estamira, sua verve e seus delírios. As mutações se explicitam física e espacialmente.

É da soma desses fatores concretos, substanciados na entrega de uma artista iluminada, que se constitui a matéria milagrosa que vai à cena. Honrando as origens do teatro, aqui os loucos tornam-se poetas. (LUIZ FERNANDO RAMOS)

ESTAMIRA
QUANDO hoje, amanhã e sáb., às 21h, e dom., às 19h; até 29/7
ONDE Sesc Pompeia (r. Clélia, 93, tel. 0/xx/11/3871-7700)
QUANTO de R$ 6 a R$ 24
CLASSIFICAÇÃO 14 anos
AVALIAÇÃO ótimo

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