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"Best-sellers são fenômenos perigosos"

Juergen Boos, presidente da Feira do Livro de Frankfurt, afirma que pessoas só leem o que é muito promovido

Para ele, seleção de brasileiros que irão ao evento em 2013, quando o país é homenageado, vai despertar polêmica

RAQUEL COZER
COLUNISTA DA FOLHA

Tão afeito a polêmicas, o meio literário brasileiro terá o que falar quando a Fundação Biblioteca Nacional (FBN) anunciar os autores a serem levados para a Feira do Livro de Frankfurt em 2013.

Na ocasião, a maior feira mundial do mercado editorial terá o Brasil como convidado de honra, e cabe à FBN elencar que escritores nos representarão no megaevento.

"A Nova Zelândia, convidada de 2012, elencou agora os autores que vão a Frankfurt. E a lista tem rendido sérias discussões", diz Juergen Boos, presidente da feira.

"O fato é que a divulgação é importante para o país."

Em São Paulo para o lançamento da versão nacional da Contec, conferência alemã sobre educação e tecnologia, Boos conversou na última quarta com a Folha sobre o Brasil, o impacto da feira e índices de leitura. Leia trechos.

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Folha - Como o sr. vê a preparação do Brasil até agora para a Feira de Frankfurt 2013?
Juergen Boos - As conversas começaram há três anos, com Juca Ferreira. O Brasil já tinha sido convidado de honra em 1994 e, naquela ocasião, houve dificuldades.
Resolvemos começar mais cedo desta vez. Já foi definido o comitê de organização, o programa de traduções está andando, instituições alemãs que farão mostras sobre o Brasil estão trabalhando.
Mas o trabalho mesmo começa agora. O comitê tem que decidir que autores levará à feira, e isso levantará a muito debate. Daqui para a frente, tudo será questionado.

Lidar com questionamentos é um dos maiores desafios?
É sempre difícil. Soube de sérias discussões e muita mágoa na Nova Zelândia, convidada deste ano, que divulgou agora sua lista de autores.
Ouvi rumores de que o Brasil anunciará em breve os seus nomes. Isso significa que vocês terão muito mais tempo para polêmicas [risos].

O sr. citou Juca Ferreira. Mas já se reuniu com a atual ministra?
Ainda não conseguimos encontrá-la. Tomara que seja possível amanhã [quinta], se ela for à Bienal [a ministra foi, mas não encontrou Boos].
Por que não houve esse encontro até agora?
Não sabemos. Estivemos algumas vezes no Brasil, encontramos outros membros do governo, mas a ministra não. Estava ocupada, talvez.

O que falta conversar?
O trabalho tem de ser feito agora, não em Frankfurt.
A Catalunha [homenageada de 2007] gastou 20 milhões de euros, sendo dois terços antes da feira, com relações públicas e exposições. E é preciso levar em conta que o foco não é só em 2013. O impacto tem de se estender.

Qual é a relevância de divulgar a literatura de um país e por que o Brasil neste momento?
O livro é um produto diferente do de outras indústrias. Mesmo um livro de gastronomia é uma história da sociedade. Escrever um romance é um modo de explicar o mundo, e o leitor pode entender de outra forma. Isso é especial.
O convidado tem de ser um país de identidade forte, voz original, levando em conta, especialmente, a literatura.
E você precisa de interessados nessa voz, seja por razões políticas, seja por econômicas. O que permite tirar a literatura do escuro. O mundo olha para o Brasil, e a literatura pode ajudar a entendê-lo.

E qual é a voz original da literatura brasileira no exterior?
Conheço só nomes antigos, Jorge Amado. É preciso trazer os novos. Antes, eu nem sequer poderia nomear escritores brasileiros, porque não eram traduzidos.
A decisão pelo país foi feita com a ajuda de gente como Marifé [Boix García, vice-presidente da feira] e estudiosos de literatura.

A que o sr. atribui o anterior desinteresse pela literatura brasileira? Falta de investimento, falta de boa literatura?
Você sempre pode culpar o governo, mas não é o suficiente quando se fala de cultura. A boa literatura não chega tão facilmente.
É difícil conseguir bons tradutores, o que leva ao governo: é preciso subsídios. Não sei quantos podem fazer boas traduções literárias do português para o alemão, para o inglês. Não mais de 20, creio.

O mercado editorial mundial passou por uma crise recente. Como está isso na Alemanha?
Há mais títulos do que nunca. Os preços subiram um pouco e o faturamento se mantém. Conclusão: menos exemplares por título, pequenas editoras vendendo menos e best-sellers como "Cinquenta Tons de Cinza" vendendo como nunca. É um fenômeno perigoso, mostra que as pessoas só leem o que é muito promovido.
Meu filho tem 12 anos e só lê uma coleção juvenil de James Bond. Os índices de leitura na Alemanha vêm caindo.

O que pode ser feito para fomentar a leitura?
Em casa há muitos livros, mas meu filho não quer minha influência. Sugiro indiretamente. Ações de Estado e institucionais são importantes. Criamos na Alemanha uma iniciativa de futebol e leitura. Crianças que querem jogar com craques se dispõem a ler.

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