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Luz no túnel

Romance aborda a vida de renúncia -e cheia de esperança- de quem enfrenta um câncer na juventude

MILLOS KAISER
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Vitor Gomes, 21, e Thaís Ferreira, 20, "ficaram" algumas vezes, mas ainda não estão namorando. "Ainda!", ressalta a moça.

Vitor está lutando contra um osteossarcoma no braço esquerdo. O palavrão é o nome científico para um tumor maligno nos ossos, que pode se espalhar para outros órgãos do corpo.

Sim, um câncer.

Ele retirou parte do osso e pôs no seu lugar uma prótese de titânio. Para impedir que as células cancerígenas se reproduzam, teve de fazer quimioterapia. O cabelo caiu. Falta apenas uma sessão.

Thaís já lutou contra um osteossarcoma, só que na perna esquerda, na qual também tem uma prótese. A primeira operação acarretou complicações e ela terá de passar por mais um procedimento em breve.

"Químio", cabelo... ela sabe como isso funciona. "Ajuda muito ter alguém em um momento assim. Ainda mais quem já passou pela mesma experiência", conta Vitor.

CULPA DE QUEM?

"Nos adultos, o câncer pode ter a ver com cigarro, com má alimentação e sedentarismo. Nos jovens, simplesmente não tem motivo", diz o médico Antonio Sérgio Petrilli, diretor do Graacc (Grupo de Apoio ao Adolescente e à Criança com Câncer), instituição em que os dois se tratam e onde se conheceram.

A falta de um motivo para a doença é a explicação para o título do livro "A Culpa é das Estrelas", de John Green, primeiro na lista de best-sellers do "New York Times".

Recém-lançado no Brasil, ele fala do desafio de se enfrentar um baque desse tamanho enquanto seus amigos vivem o auge da vida (e você deveria estar lá).

"A Culpa..." conta uma história muito parecida com a de Vitor e Thaís, mas passada em Indianápolis, nos EUA.

A personagem Hazel Grace tem 16 anos e sofre de câncer na tireoide. Em um grupo de apoio para jovens com câncer, ela conhece Augustus Waters, de 17 anos, por quem se apaixona. O rapaz também tem o tal do osteossarcoma.

Hazel apresenta seu livro preferido, o ficcional "A Aflição Imperial", a Augustus. Nele, uma menina com câncer leva uma vida normal -até que o romance acaba no meio de uma frase.

Inconformados com a ausência de um final, eles vão atrás do autor em busca de um esclarecimento. Ao mesmo tempo, tentam conciliar o amor que sentem com as limitações da doença.

Vitor sabe o que é isso. "É constrangedor ficar se abraçando e se beijando no hospital. Além de as mães estarem sempre presentes". Até agora, os dois só "ficaram" fora do Graacc uma vez, quando foram ao shopping.

Para Daniela Lara, psicóloga que atende a ambos na entidade, "o mais difícil de ter câncer nessa fase da vida é voltar a ser dependente dos pais".

"É quando a pessoa começa a descobrir quem ela é. Geralmente está começando a ganhar seu dinheiro, a querer sair de casa. De repente, ela volta a ser uma criança que precisa da mãe para tudo", explica.

RETOMADA

Thaís descobriu a doença em 2009, quando concluiu o ensino médio. A ideia -que ela pretende retomar- era fazer faculdade de fisioterapia.

"Agora tenho ainda mais certeza de que quero ser fisioterapeuta. Quero ajudar as crianças do Graacc", diz.

Já Vitor chegou a cursar um semestre de logística na universidade. Antes, havia trabalhado em um supermercado e em telemarketing. Conhecido entre as enfermeiras como "o galã do Graacc", ele às vezes põe gravata para ir às sessões de quimioterapia.

"Até pouco tempo, adolescentes com câncer eram tratados da mesma forma que os adultos. Não existia pediatria para quem tivesse mais de 12 anos", diz Petrilli.

"Hoje sabemos que o tratamento é completamente diferente. Com eles, eu falo palavrão, desafio, provoco. Digo a verdade: você está ferrado, mas não tem opção. Terá que brigar até não poder mais para reverter a situação."

Vitor e Thaís estão prontos para a batalha. Não querem que seu romance termine no meio de uma frase.

2.800
adolescentes são atendidos anualmente pelo Graacc (Grupo de Apoio à Criança e ao Adolescente com Câncer)

De cada 100 mil
jovens (até 19 anos), cerca de 20 têm câncer

Os 3
tipos de câncer mais atendidos pelo Graacc são tumores ósseos, linfomas e de sistema nervoso

70%
dos casos atendidos pelo Graacc são curados

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