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Questão não é literária, diz advogado de entidade

Ação pede que professores sejam capacitados para abordar racismo

Profissionais de ensino e escritores dizem que ficção não é realidade, mas admitem que falta orientar educadores

DE SÃO PAULO

Na opinião do advogado Humberto Adami, do Iara (Instituto de Advocacia Racial), a discussão sobre preconceito contra negros em "Caçadas de Pedrinho", de Monteiro Lobato, ultrapassa o âmbito da questão literária.

"Estamos discutindo o risco de reintrodução do racismo nas escolas. É preciso que haja programas de capacitação de professores antes de abordar o assunto, além da devida contextualização", diz ele que nega buscar a proibição da circulação da obra.

Opinião semelhante à do advogado Sinvaldo Firmo, do Instituto do Negro Padre Batista, de São Paulo. "Contextualizar ajuda a compreender as transformações históricas que nos permitem ter essa discussão aberta hoje."

O risco de medidas excessivas é uma preocupação de Chico Poli, diretor do sindicato de diretores de escolas públicas estaduais de SP.

"O politicamente correto leva a esse tipo de exagero. Ninguém ficou racista ou mais racista por causa de um livro de Monteiro Lobato. É um patrulhamento absurdo que não faz sentido em uma democracia."

Pensamento não muito distante do de Alcir Pécora, crítico e professor da Unicamp.

"Se formos fazer um expurgo por questões raciais e sexuais, não vai sobrar obra para ler. Literatura não é educação moral e cívica para elevar valores morais. O papel dela é confrontar as coisas."

Segundo Adami, o confronto que agora se abre é uma oportunidade de forçar o governo brasileiro a cumprir o seu dever, que é "zelar por uma educação livre de preconceitos".

Guiado por preocupação semelhante, tramita no Congresso Nacional um projeto de lei do senador Paulo Paim (PT-RS) para criação de uma comissão nacional de avaliação de material didático, a fim de verificar possíveis excessos do tipo.

O projeto se deu por ocasião da proibição, no Distrito Federal, do livro "Banzo, Tronco e Senzala" (ed. Harbra), em 2003, acusado de depor contra a cultura negra.

Enquanto entidades e governo batem cabeça na Justiça, mantém-se a lacuna que, segundo a consultora em educação Maria Tereza Arruda Campos, é a mais grave.

"O MEC não tem a responsabilidade de preparar professores para tratar do preconceito do Lobato. Ele tem de preparar os professores como um todo."

Enquanto não sai do debate uma definição para as salas de aula, Adami diz que, caso o MEC insista em circular o livro sem os devidos aparatos, o Iara recorrerá a cortes internacionais.

"O Brasil é signatário de tratados e acordos que visam combater o racismo. Não é o nosso plano, mas não vamos nos esquivar dessa luta."

Adami diz ainda que o escritor Ziraldo e a Academia Brasileira de Letras devem desculpas por terem apoiado Monteiro Lobato sem ressalvas. "Não fosse uma questão de fato grave, não seríamos chamados ao STF para resolver". "Li todo o Lobato, nunca percebi nenhuma ideia racista", rebate Ziraldo.

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