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Mirada reúne novidades e antologias teatrais

Espetáculo peruano é destaque do Festival Ibero-americano de Artes Cênicas de Santos (SP)

LUIZ FERNANDO RAMOS
CRÍTICO DA FOLHA

Narrativas flutuantes. Dois espetáculos brasileiros que se destacaram na primeira semana do Mirada -o Festival Ibero-americano de Artes Cênicas de Santos (SP)- propõem, de perspectivas distintas, resgates históricos com jogos de corpos fluentes.

A seleção do festival combinou criações mais recentes com outras antológicas, mas todas com o veio comum de confrontação do passado.

Exemplar desse recorte é o grupo peruano Yuyachkani, que apresenta no próximo fim de semana a produção de 2004 "Sem Título, Técnica Mista", acerto de contas com mais de um século de história do Peru, talvez o grande destaque desta mostra.

No caso das duas encenações brasileiras mencionadas -"História de Família", do Amok Teatro, do Rio, e "Retábulo" do Piolim Grupo de Teatro, da Paraíba-, a forma da narrativa prioriza os corpos dos atores e atrizes.

Em "História de Família" o Amok conclui a "Trilogia da Guerra", também composta por "O Dragão" (2008) e "Kabul" (2010).

A ação dramática agora transcorre nos Bálcãs, nos anos 1990. A dramaturgia é da sérvia Biljana Srbljanovic, e o tema de fundo a luta fratricida na ex-Iugoslávia, que opôs bósnios, croatas e albaneses do Kosovo a sérvios.

Biljana constrói uma situação clássica de pai, mãe, filho/filha e cachorro (também presente em "Isso te Interessa?", da Cia. Brasileira de Teatro, a ser apresentada hoje) para logo quebrá-la, revelando a realidade de um faz de conta de crianças em contexto de guerra civil.

A direção de Ana Teixeira e Stephane Brodt, este também ator, acompanha a espiral de rupturas do tecido dramático que a autora enseja.

O jogo proposto tem a graça de exigir um desempenho quase coreográfico dos quatro atuantes, particularmente Bruce Araújo, que verdadeiramente dança, e conjumina com os demais numa série de cenas de parricídio.

"Retábulo", criação de Luiz Carlos Vasconcelos, com apoio na dramaturgia de Márcio Marciano e do próprio grupo Piolim, gerou a expectativa de um impacto como o de "Vau da Sarapalha" (1992).

De fato, mesmo reconhecendo-se a riqueza do material apresentado, um conto do escritor pernambucano Osman Lins (1924-1978), e com o desconto de um espaço cênico inadequado, sem a acústica necessária à peça de câmara, o Piolin ainda mira aquele momento mítico.

O livro utilizado, "Nove, Novena" (1966), tem no seu conto mais longo, o "Retábulo de Santa Joana Carolina", a saga de uma professora primária no sertão, contada em doze partes e evocando uma avó paterna do escritor.

Vasconcelos mediou sua encenação com outra obra de Lins, "Avalovara" (1973), de onde retira a estrutura geométrica do espetáculo.

Tantos cuidados, somados à delicada composição de um coro móvel, que, sutil, narra e se desmembra em protagonistas fugazes, não alcançam o simples contar daquela fábula.
Se os movimentos e controle da cena são encantadores, os narradores da peça, em si, imersos no registro lírico e prejudicados na emissão vocal, perdem o olhar do público.

Nos dois espetáculos os corpos fluem e predominam, mas só em um deles isso resulta em impacto real, ou em narrativa assimilada.

MIRADA - FESTIVAL IBERO-AMERICANO DE ARTES CÊNICAS DE SANTOS
QUANDO até 15/9
ONDE Santos e cidades vizinhas; informações sobre a programação em sescsp.org.br/mirada

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