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Antônio Araújo ousa em ópera de Gluck Fundador do Teatro da Vertigem dirige "Orfeu e Eurídice" em sala de ensaio da Orquestra Sinfônica Municipal Encenador recria e atualiza o mito grego transformando a cidade de São Paulo em metáfora para o inferno JOÃO BATISTA NATALICOLABORAÇÃO PARA A FOLHA "Orfeu e Eurídice", de Christoph Willibald Gluck (1714-1787), revolucionou ao seu tempo a linguagem da ópera. Ela continua a ser montada por sua incrível beleza musical. A produção do Theatro Municipal de São Paulo, que estreia hoje em temporada de cinco récitas, acrescenta dois novos atributos: criatividade e ousadia. Os músicos, cantores e figurinistas migraram da praça Ramos de Azevedo para a sala de ensaio da orquestra, na Praça das Artes, a menos de 300 metros de distância. O ambiente é uma imensa caixa de concreto, com apenas 320 lugares e laterais ainda sem janelas envidraçadas. É exatamente do que precisava Antônio Araújo, fundador do Teatro da Vertigem e que produziu há quatro anos um insólito "Dido e Enéas", de Purcell, no depósito de cenários do Municipal, no bairro do Canindé. Como diretor cênico, ele virou a ópera de cabeça para baixo, com a ajuda do maestro Nicolau de Figueiredo, das sopranos Edna D'Oliveira (Amor) e Gabriella Pace (Eurídice) e da contralto Kismara Pessatti (Orfeu). A peça, uma das 35 que Gluck escreveu, estreou em Viena, em 1762, e representou uma faxina na linguagem lírica, com a volta à simplicidade musical. Acabou com o atletismo vocal que desvirtuava o repertório e o colocava a serviço do exibicionismo dos cantores. Conta o mito de Orfeu, músico da mitologia grega, que enviúva de Eurídice e vai buscá-la no reino dos mortos. Mas ele não deverá conferir com o olhar se ela o acompanha no caminho de retorno. Ansioso e apaixonado, ele quebra essa regra e perde Eurídice pela segunda vez. Antônio Araújo introduz uma outra dualidade à que prevê os mundos dos mortos contra o dos vivos. O "inferno" é a São Paulo que entra pelas janelas do teatro ainda inacabado. É um ciclista atropelado, é a tropa de choque da polícia, é o ruído de britadeiras. "Orfeu sai da mitologia e cai na cidade", diz ele, "como se atravessasse a ponte que separa o plano mitológico da vida real". Quanto à música, Nicolau de Figueiredo diz que nos tempos de Gluck os pentagramas não traziam indicações sobre a intensidade com que as notas e frases precisavam ser tocadas. Isso exige maior intervenção do regente, que precisa convencer a orquestra de que a pulsão melódica precisa de uma certa rapidez, para não cair na monotonia. A outra surpresa do espetáculo ficou com a voz da contralto Kismara Pessatti. É o primeiro "Orfeu" de sua carreira. Seus três próximos compromissos: estará em Wagner, com a Filarmônica de Berlim, será solista de uma peça contemporânea no Concertgebow, de Amsterdã, e de uma ópera de Chostakovich, em Zurique.
ORFEU E EURÍDICE |
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