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Mostra ilumina obsessões de Morandi

Retrospectiva do artista italiano, mestre da natureza-morta, reúne mais de 50 de seus trabalhos em Porto Alegre

Exposição na Fundação Iberê Camargo remonta salas do pintor nas edições de 1953 e 1957 da Bienal de São Paulo

SILAS MARTÍ ENVIADO ESPECIAL A PORTO ALEGRE

Ele era o pintor das garrafas. Isso porque elas não saem do lugar e respondem sempre da mesma forma à incidência da luz. Giorgio Morandi, morto aos 73, em 1964, não gostava da figura humana e fez do retrato dos objetos de seu ateliê o microcosmo de um mundo em que o único pretexto era a pintura.

No teatro das formas que inventou, vasos, copos e garrafas aparecem e reaparecem em telas sucessivas, deslocados às vezes milímetros em relação à posição anterior.

Morandi foi o mestre obsessivo da natureza-morta. Sua obra, de silêncio estarrecedor e vazios que emolduram chaleiras e bules arquetípicos, está agora em retrospectiva na Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre.

Num esforço louvável, o museu conseguiu remontar em parte a sala de pinturas que o artista italiano levou à Bienal de São Paulo em 1957, quando venceu o prêmio da mostra como melhor pintor.

Também estão lá 15 das 25 gravuras que Morandi expôs na Bienal de 1953, uma reconstituição exata do momento em que o autor pôde ser apreciado pelo Brasil.

Morandi nunca veio ao país. Mal saía do ateliê. Uma das telas retrata, aliás, a vista que tinha da janela, uma estrada de terra que vira faixa branca entre as casas letárgicas de seu vilarejo perto de Bolonha.

"Do jeito que retrata os objetos, a paisagem tem essa fixidez", diz Lorenza Selleri, uma das curadoras da mostra. "Não há narrativa nas telas, o céu é achatado, sem nuvens. Ele quis as coisas imóveis, como lascas de pedra."

Tanto que, no ateliê, Morandi marcava a lápis a posição de cada objeto sobre a mesa, para evitar que saíssem do lugar, e ficava sempre no mesmo ponto diante do quadro, evitando mudanças de perspectiva. Um método que se aproxima do teatro, com marcações cênicas no palco.

Mas nada acontece nos quadros. Sua busca por formas e cores determinadas também fez com que pintasse o fundo de bacias, tingisse de branco algumas peças de vidro, anulando a função dos objetos em nome de um efeito plástico controlado.

Mesmo as flores que aparecem numa série de quadros são de mentira, pétalas de seda que não definhavam e ganhavam com o tempo uma camada de poeira que Morandi retratava como um revestimento, o pó como verniz.

É fato que no final da vida suas telas se tornaram mais luminosas e depuradas, quase abstratas, embora os mesmos objetos continuem ali.

"Seus detratores o atacavam por pintar só garrafas, e sempre as mesmas garrafas", diz Selleri. "Mas ele dizia que era como música, que sinfonias inteiras são construídas com as mesmas notas."


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