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Estrada sem fim

A www faz 25 anos

JOHN NAUGHTON TRADUÇÃO CLARA ALLAIN

RESUMO A World Wide Web faz um quarto de século envolta em debates sobre a segurança da navegação; seu inventor, o inglês Tim Berners-Lee, propôs agora uma constituição global que garanta uma rede "aberta e neutra", tópicos centrais do Marco Civil da Internet, que o Congresso vota nesta semana. Leia 25 fatos sobre a www, 25.

1. "INOVAÇÃO SEM PERMISSÃO"

O que a internet tem de mais extraordinário é o fato de ela permitir a inovação sem licença. Isso vem de duas decisões fundamentais de design tomadas por seus criadores no início dos anos 1970: que não haveria controle central ou proprietário; e que ela não seria otimizada para nenhum programa em particular: tudo o que faria seria receber pacotes de dados de um programa em uma ponta e fazer o melhor possível para entregar esses pacotes em seu destino.

A rede não impunha dogmas quanto ao conteúdo desses pacotes. Se você tivesse uma ideia de um programa que pudesse ser realizado usando pacotes de dados (e fosse inteligente o suficiente para escrever o software necessário), então a rede faria isso por você, sem questionar nada. Isso teve o efeito de facilitar tremendamente as inovações, tendo como resultado uma explosão de criatividade.

O que os criadores da internet conceberam foi, na prática, uma máquina global para produzir surpresas. A web foi a primeira surpresa realmente grande, e ela veio de um indivíduo, o físico Tim Berners-Lee. Em 12 de março de 1989 ele escreveu a primeira proposta do que viria a ser a web e, com um grupinho de auxiliares, escreveu os softwares e arquitetou os protocolos necessários para implementá-la. E então a lançou para o mundo, colocando-a no servidor de internet da Cern (Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear) em 1991, sem precisar pedir a autorização de ninguém.

2. A WEB NÃO É A INTERNET

Embora muitas pessoas frequentemente as confundam --inclusive gente que deveria saber a diferença. O Google também não é a internet, nem o Facebook o é. Pense na internet como sendo análoga aos trilhos e à sinalização de um sistema ferroviário, e os programas --por exemplo a web, o Skype, o compartilhamento de arquivos e o streaming-- como os tipos de tráfego que percorrem essa infraestrutura. A web é importante, mas é apenas uma das coisas que funcionam na internet.

3. GRATUITA E ABERTA

A internet foi criada por governos e funciona com softwares de código aberto. Ninguém é "dono" dela. Mas empreendimentos e fortunas colossais se ergueram sobre essa base "gratuita", fato que os fanáticos neoliberais à frente de empresas na internet frequentemente parecem esquecer. Berners-Lee poderia ter ficado riquíssimo se tivesse visto a web como oportunidade comercial. Mas não o fez --e persuadiu a Cern de que ela deveria ser dada ao mundo como recurso gratuito. Assim, a web, por sua vez, tornou-se uma plataforma de inovação que prescinde de permissão, como é a internet. Foi graças a isso que um estudante de Harvard pôde lançar o Facebook.

4. NEM TUDO É GRÁTIS/ABERTO

Mark Zuckerberg pôde construir o Facebook porque a web era gratuita e aberta. Mas ele não devolveu o favor: sua criação não é uma plataforma a partir da qual jovens inovadores possam lançar gratuitamente surpresas. O mesmo se aplica à maioria dos outros que fizeram fortuna explorando as facilidades oferecidas pela web. A única exceção real é a Wikipedia.

5. TIM BERNERS-LEE É O REAL HERDEIRO DE GUTENBERG

Em 1455, Johannes Gutenberg lançou sozinho uma transformação no ambiente de comunicações que vem moldando a sociedade desde então. Antes de Berners-Lee ninguém fizera algo comparável.

6. A WEB NÃO É ESTÁTICA

A web que usamos hoje é muito diferente da nascida há 25 anos. Podemos pensar na sua evolução em termos de "eras" geológicas. A web 1.0 foi a web estática, só de leitura, que existiu até o final dos anos 1990. A web 2.0 é a dos blogs, dos serviços, do mapeamento, dos "mashups" e assim por diante --a web que o comentarista americano David Weinberger descreveu como feita de "pedacinhos vagamente interligados". Os contornos da web 3.0 estão apenas começando a aparecer sob a forma de programas que conseguem "entender" o conteúdo de páginas (a chamada "web semântica"), a web de dados (programas que conseguem ler, analisar e garimpar a torrente de dados publicada rotineiramente em sites), e assim por diante. Depois disso, haverá a web 4.0 e assim por diante, ao infinito.

7. LEI DA POTÊNCIA

A lei da média se aplica a muitas áreas --a maioria das coisas é distribuída estatisticamente em um padrão que se parece com um sino, a "distribuição normal". Tome-se o caso da altura humana. A maioria das pessoas tem altura mediana, e há relativamente poucas pessoas muito altas ou muito baixas. Mas muito poucos fenômenos on-line seguem esse padrão. Eles obedecem ao que os estatísticos chamam "distribuição da lei de potência", razão pela qual um número muito reduzido dos bilhões de sites existentes no mundo atrai a maioria avassaladora do tráfego, enquanto a longa cauda dos outros sites recebe muito pouco.

8. HOJE A WEB É DOMINADA POR GRANDES EMPRESAS

Apesar de que qualquer um pode ter um site, a maioria dos cem maiores sites é de corporações. A única exceção real é a Wikipedia.

9. O ENORME PODER (NÃO REGULADO) QUE ELA DÁ A EMPRESAS

Tome-se o caso do buscador dominante, o Google. Se uma busca nele não localiza seu site, na prática, você não existe. Essa situação só vai se agravar, à medida que mais negócios do mundo forem levados on-line. Às vezes o Google modifica algoritmos para frustrar quem tenta passar ao largo dela, pela chamada "otimização para motor de busca". Contudo, a cada vez que o Google faz modificações, negócios e serviços on-line são prejudicados ou somem por completo. E não há possibilidade real de recuperação para eles.

10. PRÓTESE DE MEMÓRIA

Você já percebeu que não precisa mais tentar se lembrar de várias coisas porque sabe que basta procurá-las no Google?

11. A WEB E O NETWORKING

A web é baseada na ideia do "hipertexto" --documentos em que alguns termos são dinamicamente vinculados a outros documentos. Mas quem inventou o hipertexto não foi Berners-Lee, e sim Ted Nelson, em 1963, e já havia muitos sistemas de hipertexto bem antes de Berners-Lee começar a pensar na web. Os sistemas todos, porém, funcionavam interligando documentos num computador. A sacada de Berners-Lee foi o uso da internet para criar vínculos (links) entre documentos que podiam ser armazenados em qualquer lugar. E isso fez toda a diferença.

12. UMA ONDA DE CRIATIVIDADE

Antes da web, pessoas comuns só podiam publicar ideias e criações se convencessem guardiões dos portais da mídia a lhes dar destaque. Mas a web deu a elas uma plataforma global para publicar seus escritos (Blogger, Wordpress, Typepad, Tumblr), fotos (Flickr, Picasa, Facebook), áudios e vídeos (YouTube, Vimeo), e as pessoas agarraram a oportunidade.

13. JÁ NO INÍCIO, A WEB DEVIA PERMITIR LEITURA E ESCRITA

O desejo original de Berners-Lee era de que as pessoas não apenas publicassem páginas, mas as modificassem. Considerações práticas acabaram levando à solução de meio-termo: uma web só de leitura em que qualquer pessoa podia publicar, mas só autores ou donos de páginas podiam modificá-las. Isso levou a web a evoluir em certo rumo e foi provavelmente o que garantiu que as grandes empresas se tornassem dominantes.

14. A WEB SERIA MAIS ÚTIL SE SUAS PÁGINAS PUDESSEM SER LIDAS POR MÁQUINAS

As páginas na Web são, por definição, passíveis de leitura por máquinas. Mas as máquinas não compreendem o que "leem", porque não têm capacidade semântica. Assim, não sabem dizer facilmente se a palavra "Casablanca" se refere a uma cidade ou a um filme. A proposta de Berners-Lee de uma "web semântica" --ou seja, uma forma de reestruturar páginas para que os computadores façam mais facilmente a distinção entre Casablanca, a cidade, e "Casablanca", o filme-- é uma abordagem possível, mas exigiria muito trabalho inicial, e é pouco provável que aconteça em grande escala. Talvez sejam mais úteis técnicas melhoradas que farão com que os computadores se tornem mais hábeis na compreensão de contextos.

15. OS "KILLER APPS"

Um "aplicativo matador" é aquele que mostra, de maneira evidente, a necessidade de adoção de uma dada tecnologia. A planilha foi o "killer app" do primeiro computador Apple. O e-mail foi o primeiro "killer app" da Arpanet, a precursora da internet. E a web foi o primeiro "killer app" da internet. Antes dela --em especial antes do primeiro browser gráfico, Mosaic, de 1993--, quase ninguém conhecia ou dava importância à internet (que funcionava desde 1983). O aparecimento da web fez com que as pessoas captassem o que era a internet. O resto é história.

16. UM PARADOXO DA LÍNGUA

O escritor Douglas Adams (1952-2001) certa vez observou que www é a única sigla mais difícil de pronunciar do que aquilo que deveria representar.

17. A WEB ILUSTRA O IMENSO PODER DOS SOFTWARES

Softwares são puras "coisas mentais". Você tem uma ideia, escreve instruções numa linguagem especial (um programa de computador) e as insere numa máquina que as obedece fielmente. É uma espécie de magia secular. Sir Tim Berners-Lee teve uma ideia; ele escreveu o código; ele o colocou na rede; e a rede fez o resto. Nesse processo, ele mudou o mundo.

18. A WEB PRECISA DE UM SISTEMA DE MICROPAGAMENTOS

Além de ser um sistema só de leitura, o outro problema da web ao nascer era o de não ter um mecanismo para pagar pessoas que publicavam nela. Isso porque não existia sistema on-line eficiente que possibilitasse o processamento seguro de transações muito pequenas em grande volume (os sistemas de cartão de crédito são caros e desajeitados demais para as transações pequenas). Mas a ausência de um sistema para micropagamentos gerou uma evolução tortuosa; empresas ofereciam serviços supostamente gratuitos, mas que tinham um custo oculto e não declarado: a exploração dos dados pessoais dos usuários. Isso levou à situação grosseiramente desigual de hoje, em que as empresas on-line fazem com que os usuários façam a maior parte do trabalho, enquanto elas colhem as recompensas financeiras.

19. O HTTPS NÃO TORNOU A WEB SEGURA COMO PENSÁVAMOS

O HTTP é um protocolo --um conjunto acordado de convenções-- que regula as conversas entre seu browser e um servidor da web. Mas ele não é seguro, porque qualquer pessoa que esteja monitorando a interação pode lê-la. O HTTPS (que significa HTTP seguro) foi desenvolvido para encriptar interações em trânsito que contivessem dados sensíveis (por exemplo, as informações de seu cartão de crédito). As revelações de Edward Snowden sobre a espionagem feita pela NSA sugerem que a agência possa ter enfraquecido de forma proposital esse e outros protocolos-chave da internet.

20. AINDA NÃO MEDIMOS O IMPACTO AMBIENTAL DA WEB

A web é movida em grande parte por enormes bancos de servidores mundo afora, os quais requerem grandes quantidades de eletricidade para mover e esfriar computadores (sem falar na pegada de carbono e nos custos em recursos naturais da construção dessas instalações). Ninguém sabe ao certo qual é o impacto ambiental da web, mas certamente não é desprezível. Alguns anos atrás o Google afirmou que sua "pegada de carbono" era comparável à do Laos ou à da ONU. Hoje a empresa diz que cada usuário seu é responsável por uma emissão de cerca de oito gramas de dióxido de carbono ao dia. O Facebook diz que, apesar de a atividade de seus usuários ser mais intensa, sua pegada é significativamente inferior à do Google.

21. A WEB QUE VEMOS É APENAS A PONTA DE UM ICEBERG

A web é imensa --seu tamanho ninguém sabe, mas a parte dela que é alcançada e indexada por buscadores é só sua superfície. Suas profundezas são páginas geradas dinamicamente, sem links com outros sites, e páginas que exijam login, páginas que não motores de busca não veem. A maioria dos especialistas acha que a "deep web" é de uma magnitude muitíssimo maior que os 2,3 bilhões de páginas que vemos.

22. O CHEFE DE TIM BERNERS-LEE FOI O PRIMEIRO DE MUITOS A NÃO ENTENDER SUA IDEIA

O gerente de Berners-Lee na Cern escreveu "vago, mas interessante" sobre a primeira proposta que ele lhe apresentou --a reação de quase qualquer pessoa diante de algo inteiramente novo.

23. NENHUM MEIO DE COMUNICAÇÃO JAMAIS CRESCEU TÃO RAPIDAMENTE COMO A Web

Isso se mede pelo tempo que um meio leva para chegar aos primeiros 50 milhões de usuários. Para o rádio, foram 38 anos; para a TV, 13. A web chegou lá em 4.

24. LEITORES CRUÉIS

O tempo médio de uma visita a uma página não chega a um minuto. Os primeiros dez segundos são críticos para o internauta decidir se vai ficar nela ou partir para outra. Durante esses segundos, a probabilidade de que parta é muito grande. Ainda é altamente provável que ele parta nos próximos 20 segundos. Apenas depois de o internauta ter passado 30 segundos na página, aumentam as chances de que ele conclua a leitura.

25. A WEB EMBURRECE?

Escritores como Nick Carr estão convencidos de que sim. Carr acha que as pessoas são menos contemplativas hoje porque a web as distrai. "À exceção dos alfabetos e dos sistemas numéricos", ele escreve, "a internet é possivelmente a mais poderosa tecnologia de alteração da mente que jamais se disseminou". Mas se a tecnologia tira, ela também dá. Para cada tecnopessimista como Carr há pensadores como Clay Shirky, Jeff Jarvis, Yochai Benkler, Don Tapscott e muitos outros (entre os quais eu me incluo) para os quais os benefícios superam, por muito, os custos.


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