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Ciência

A mecânica da biologia

Nanorrobôs capazes de consertar o cérebro

RESUMO O Grupo de Neurobiologia Sintética do MIT, nos EUA, está desenvolvendo nanorrobôs para tratar desordens cerebrais. O grupo obteve experiências bem-sucedidas com camundongos no tratamento da cegueira. Ed Boyden, diretor do grupo, diz que o tratamento pode ser mais eficaz que o uso de medicamentos.

IAN TUCKER

TRADUÇÃO CLARA ALLAIN

Ed BoydEn dirige o Grupo de Neurobiologia Sintética do Media Lab do MIT (Massachusetts Institute of Technology), nos EUA. Ele trabalha no desenvolvimento de tecnologias e ferramentas para revelar quais neurônios estão envolvidos em diferentes processos cognitivos e usar esse conhecimento para tratar desordens cerebrais.

Leia abaixo a entrevista que Boyden concedeu ao "Observer".

Pergunta - O que é neurobiologia sintética?

Ed Boyden - A biologia sintética consiste em tirar moléculas do mundo natural e descobrir como convertê-las em minimáquinas que podemos usar para tratar problemas cerebrais complexos.

Se conseguimos sintetizar a computação do cérebro e escrever informações sobre ela, isso nos permite testar nossa compreensão do cérebro e consertar desordens, controlando os processos internos -ou seja, fazendo um software funcionar no cérebro, como se este fosse um computador.

Quão importante foi a sua formação em engenharia elétrica e física para essa pesquisa?

Estudar física foi muito útil. Você é treinado a pensar nas coisas tanto no nível lógico quanto no intuitivo. A engenharia elétrica também foi ótima porque os neurônios são dispositivos elétricos, e temos que pensar em circuitos e redes.

Eu me interessava pelas grandes incógnitas, e o cérebro é uma das maiores, de modo que construir ferramentas que enxergam o cérebro como um grande circuito elétrico foi algo que me atraiu.

Então temos uma "placa de circuito" cerebral?

Não sabemos quantos tipos de células existem no cérebro. Gosto de pensar o cérebro como um iPhone: existem milhões deles, todos possuem o mesmo mapa, mas neste momento todos estão fazendo computações diferentes, desde arremessar pássaros [no jogo Angry Birds] até ler um e-mail. É preciso mais que um mapa para compreender uma computação.

Então como você descobre sobre as funções dos diferentes neurônios?

Estamos construindo robôs capazes de nos ajudar a analisar o cérebro em resolução unicelular. Esperamos usá-los para colher os conteúdos de células e descobrir quais são suas propriedades. A ponta desse robô tem um milionésimo de um metro de largura.

E o que farão com as informações?

Trabalhamos em tecnologias robóticas ou interfaces tridimensionais que permitem dirigir informações a milhares de pontos do cérebro, para que possamos determinar quais circuitos são importantes para um processo cognitivo dado ou para consertar uma desordem.

Isso não é invasivo?

Algum grau de invasão não é o fim do mundo: 250 mil pessoas já possuem algum tipo de implante neural. Tratamentos invasivos feitos com sutileza podem ser mais desejáveis do que algo que você tenha que usar o tempo todo, como um capacete, por exemplo.

Suas técnicas já foram empregadas em seres vivos?

Tentamos restaurar a visão de um olho cego. Há muitos exemplos de olhos cegos em que os fotorreceptores desapareceram; nesses casos, não há medicamentos que possam ser usados porque não há nada a que possam se prender.

Os neurônios são dispositivos elétricos. Normalmente, células fotossensoras na retina captam a luz e a transformam em sinais elétricos, que podem então ser processados pela retina e transmitidos para o cérebro.

O que fizemos foi tirar uma proteína sensível à luz de uma espécie de alga verde que converte luz em sinais elétricos, e então nós a instalamos em células poupadas na retina de um camundongo cego. As células fotossensibilizadas na retina captaram luz.

A retina anteriormente cega tornou-se uma câmera. Descobrimos que, se pegássemos um camundongo cego e tornássemos sua retina sensível à luz, ele era capaz de se orientar por um labirinto bastante complexo.

Quanto falta para usar essas técnicas com seres humanos?

Meu laboratório se preocupa em inventar as ferramentas. Mas, entre as pessoas que buscam tratamentos para a cegueira, há pelo menos cinco grupos que anunciaram planos ou iniciaram empreendimentos para pegar essas tecnologias e aplicá-las em humanos.

Quais são as vantagens dessas tecnologias em comparação com medicamentos?

Existem muitas desordens em que um tipo específico de célula no cérebro se atrofia ou degenera. Se pudermos enviar informações a essa célula, poderemos corrigir uma desordem cerebral com mais precisão, ao mesmo tempo minimizando os efeitos colaterais.

Um medicamento poderia afetar células saudáveis além das células que precisam de conserto, provocando efeitos colaterais.

Essas ferramentas poderiam ser usadas para ajudar na descoberta de medicamentos?

Suponhamos que pudéssemos percorrer o cérebro com fontes de luz e rastrear quais moléculas específicas sobre células específicas exercem mais impacto no tratamento de uma desordem. Se pudermos encontrar uma droga capaz de fixar-se a essa molécula, embora apenas uma em cada dez moléculas seja passível de aceitar que drogas se fixem a ela, talvez possamos desenvolver medicamentos que afetam classes específicas de células cerebrais, e não outras.

Este texto foi publicado no jornal britânico "The Observer"; leia a íntegra da entrevista em folha.com/no1062059

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