São Paulo, domingo, 02 de outubro de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

DIÁRIO DE BERLIM
O MAPA DA CULTURA

Irradiação de arte

"Chansons" cheias de bossa alemã

SILVIA BITTENCOURT

ACABA DE COMPLETAR cinco anos um dos mais importantes espaços culturais de Berlim. Leva o estranho nome de Radialsystem e tornou-se um agitado centro de produção artística e eventos em geral. O visitante pode passar o dia, pois sempre encontra o que ver (ou fazer) nas salas e nos saguões dos seis andares da insitituição.
Às margens do rio Spree, no antigo lado oriental, o prédio foi inaugurado como usina em 1881. Com o rápido crescimento urbano, as instalações para o escoamento de água foram ampliadas, seguindo o princípio de um "sistema radial". Mais de um século depois, seus recriadores acharam o nome original apropriado para o novo projeto, um centro artístico que irradiasse em várias direções.
O local é espaço sobretudo para projetos que combinam tradição e inovação -proposta aplicada na arquitetura atual, que integra a antiga construção em um grande anexo de vidro, aço e concreto. Um exemplo é o encontro de música antiga com dança e teatro contemporâneos, como aconteceu em uma de suas primeira produções, "4 Elementos - 4 Estações" (2007).
Naquele ano, sob a direção de Sasha Waltz -uma das maiores coreógrafas alemãs da atualidade e um dos principais nomes do Radialsystem-, os músicos de uma orquestra dançavam e atuavam no palco, ao mesmo tempo em que tocavam peças de Jean-Féry Rebel e Antonio Vivaldi. No momento, Waltz vem juntando os dançarinos de seu "ensemble" com solistas do grupo berlinense Kaleidoskop em um novo concerto coreográfico, o espetáculo "Metamorfoses".
Há ainda os eventos fixos, como o salão de Annette Dasch, mistura de sarau e "talk show" promovido pela famosa soprano berlinense, e o coro "Eu Não Sei Cantar", aberto a qualquer visitante. O vídeo comemorativo pode ser visto em vimeo.com/28657908.

BOSSA FRANCO-GERMÂNICA
Em turnê pela Europa, apresentou-se há pouco no Radialsystem a cantora de jazz berlinense Céline Rudolph. Filha de mãe francesa e pai alemão, apaixonada pelo Brasil e pela África, ela lançou recentemente o disco "Salvador", homenagem ao "chansonnier" francês Henri Salvador, morto em 2008.
Mestre na improvisação e com um repertório amplo, a cantora de jazz não é totalmente desconhecida do público brasileiro. Gravou em São Paulo os álbuns "Brazaventure" (2007) e "Metamorflores" (2009) -este teve participação de nomes como Naná Vasconcelos e Marlui Miranda e, no ano passado, rendeu à intérprete o Prêmio Echo Jazz. O mais recente álbum traz, além de clássicos de Salvador, como "Syracuse" e "Jardin d'Hiver", elementos da bossa nova e ritmos africanos. Para completar a mistura, Céline canta em alemão (ouça em celinerudolph.com/music).
Vale lembrar que Salvador foi um apaixonado pelo Brasil, onde fez turnê com a orquestra de Ray Ventura, nos anos 40, sendo considerado por muitos um dos precursores da bossa nova. Na versão de Céline, suas "chansons" ganham tom ainda mais familiar ao público brasileiro. E, na sua belíssima voz, o texto em alemão nem incomoda.

IDENTIDADE PRESENTE
"Heimatkunde" é o nome em alemão para uma disciplina que abrange história, geografia e biologia local ou regional. Foi com o mesmo nome que se batizou, no Museu Judaico de Berlim, a reunião de 30 artistas alemães e estrangeiros imigrantes em torno dos temas Alemanha, pátria e identidade nacional. A exposição integra os eventos comemorativos de dez anos do museu -cuja construção em zigue-zague, assinada pelo americano Daniel Libeskind, tornou-se um marco da cidade.
A mostra escapa às tradicionais retrospectivas da história e cultura judaicas da instituição. Apesar de trabalhos como o da nova-iorquina Emily Hass -que foi atrás de sua história familiar e juntou projetos das casas em que o pai viveu antes de fugir dos nazistas-, a exposição em geral tem os olhos voltados para o presente e o futuro.
É o caso dos alemães Via Lewandowsky e Durs Grünbein, cuja encenação de uma sala de espera remete a um órgão público (e à burocracia?) local. E da brasileira Maria Thereza Alves, que explora o mundo das plantas de Berlim. Sua instalação verde, chamada "Wake", é feita a partir de sementes que ela procurou no chão de obras da cidade e cultivou.


Texto Anterior: Educação: Chile em transe
Próximo Texto: Arquivo Aberto: Personagem nos muros
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.