São Paulo, domingo, 17 de outubro de 2010

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DIÁRIO DE BERLIM
O MAPA DA CULTURA

Nazismo e cinema

Uma ficção para "Jud Süss"

SILVIA BITTENCOURT

SEIS ANOS DEPOIS de "A Queda! As Últimas Horas de Hitler", entra em cartaz "Jud Süss - Filme sem Consciência", de Oskar Roehler. E vem polemizando, como sempre acontece na Alemanha quando um filme de ficção recria os bastidores do Terceiro Reich. A fita conta a história de outro filme, também chamado "Jud Süss", que Joseph Goebbels, chefe da propaganda nazista, encomendou no final dos anos 30 ao cineasta Veit Harlan. A ideia era inflamar o espírito dos alemães contra os judeus.
O resultado foi uma das obras antissemitas mais pérfidas daqueles tempos. Tanto que a divulgação do "Jud Süss" original é proibida na Alemanha e alguns membros da comunidade judaica pedem agora o mesmo destino para o filme atual, por reproduzir cenas da fita antiga. O filme original conta a história do judeu Joseph Süsskind Oppenheimer, que viveu no século 18 e fez carreira junto a um duque alemão. Cada vez mais poderoso, passou a ser chamado difamatoriamente de "Jud Süss" (pronuncia-se "iud zus") e acabou enforcado. Sua história serviu de enredo para várias obras literárias antes de ser usada no filme de Veit Harlan, que apresenta Süss como um judeu criminoso e sem escrúpulos, mas extremamente sedutor.
"Jud Süss" estreou no Festival de Veneza no ano de 1940, quando foi aplaudido até pela crítica internacional. Em seguida, calcula-se que tenha sido assistido por 20 milhões de pessoas.
Oskar Roehler mostra agora o processo de criação de "Jud Süss" sob a perspectiva do ator principal, o galã austríaco Ferdinand Marian, que viria a rodar outros filmes para os nazistas até morrer num acidente de carro em 1946 (suspeita-se de suicídio). Roehler, porém, mudou vários detalhes da biografia de Marian para apimentar a história. No filme, por exemplo, a mulher do ator é judia, o que não é verdade.
Ao mesmo tempo, o diretor recriou em preto e branco algumas cenas do "Jud Süss" original. Esta mistura de ficção e documentário irritou a crítica alemã, sensível a questões da Segunda Guerra: até onde se pode inventar, quando se mexe com o Holocausto? Também não agradaram as frequentes cenas de sexo do filme de Roehler: Goebbels desabotoa as calças para a secretária, Marian penetra por trás a mulher de um general nazista, entre outras. O espectador fica com a impressão de que o sexo permeou as decisões no Terceiro Reich.
Mas o filme de Oskar Roehler (veja o trailer em www.jud-suess-film.de) -uma espécie de "Tarantino alemão", que gosta de provocar- tem seus méritos.
O ator austríaco Tobias Moretti, no papel de Marian, e o alemão Moritz Bleibtreu (de "O Grupo Baader Meinhof"), como um Goebbels caricaturado, brilham em cena.
O filme mostra bem como vários atores da época vacilaram antes de aceitar papéis em fitas de propaganda. Também fica clara a enorme influência do chefe nazista sobre Veit Harlan, para que dali saísse uma obra de propaganda antissemita sutil, "de nível". "Nada de propaganda barata", dizia. (Leia mais em folha.com/ilustrissima)

O RESTO DA VELHA BERLIM
Berlim passou um ano lembrando os 20 anos da reunificação alemã. O que sobrou das comemorações foi uma grande exposição no Museu Histórico Alemão, "1990 - O Caminho da Unidade" (até 2 de janeiro), além de vários livros.
Entre eles está "Rest-Berlin", do fotógrafo Andreas Muhs, que mostra um outro lado da hoje sofisticada capital: prédios velhos, ruínas pichadas, terrenos baldios -enfim, o que restou da velha Berlim (www.zeit.de/kultur/2010-09/rest-berlin-2).

FOTOGRAFIA
Durante seis semanas, acontece o "Mês da Fotografia". Um dos destaques das 150 exposições é o alemão Peter Lindbergh, famoso no mundo da moda. Num megaevento na galeria C/O, ele dedica a Berlim muitas de suas fotos (www.peterlindbergh.com).


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