São Paulo, domingo, 28 de novembro de 2010

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DIÁRIO DE LOS ANGELES
O MAPA DA CULTURA

No rastro de Frank Gehry

Modernismo sem utopia

FERNANDA EZABELLA

WERNER HERZOG, o cineasta alemão, costuma repetir que Los Angeles é a cidade com mais "substância cultural" dos EUA, uma vez ultrapassado o brilho superficial do glamour hollywoodiano.
Uma forma de encontrar esta cidade "substanciosa" é se perder (de carro) em busca de suas casas famosas. Mas não as mansões das celebridades -como mostram as centenas de passeios oferecidos aos turistas- e sim as construções de arquitetos pioneiros, como a lendária Eames House (eames house.org), marco do modernismo, ou as várias com a assinatura do arquiteto Frank Gehry.
"Gehry está no mundo todo, mas aqui há uma concentração de casas particulares feitas por ele que não se vê em outros lugares, onde há mais museus e escolas", disse à Folha a crítica Sylvia Lavin, professora no departamento de arquitetura da Universidade da Califórnia em Los Angeles (Ucla).
"Nem todo mundo pode pagar para viver com detalhes fetichistas. Esta foi uma ótima ideia de Gehry, que levou a arquitetura para outra direção."
Lavin escreveu a introdução do livro "Frank Gehry - The Houses", que traz na capa a quase surrealista Schnabel House (1989), que aparece também entre as 20 citadas no livro "Living Architecture - Greatest American Houses of the 20th Century" [Arquitetura Viva - Melhores Casas Americanas do Século 20], lançado mês passado.
A Schnabel House, entregue no mesmo ano em que o arquiteto recebeu o Prêmio Pritzker, fica em Brentwood (526, Carmelina Drive), bairro de outras construções do arquiteto, como a Sturges House (1939), do arquiteto Frank Lloyd Wright (441, Skyewiay Road). [Veja galeria de imagens em folha.com.br/ilustrissima]
São como "objetos colocados na paisagem, como uma natureza-morta de Morandi", explica Gehry sobre o conjunto de quatro unidades que compõem uma espécie de vila da Schnabel House, hoje casa do produtor da Broadway Jon Platt.
"Viver numa casa de Gehry transforma o morador em artista. Os interiores pedem a bagunça ativa do proprietário para que a decoração seja finalizada. Você participa do design", acredita Lavin.
Gehry, 81, nasceu em Toronto e faz parte do grupo de artistas que se mudou para L.A. em meados do século passado para criar uma espécie de versão pós-Guerra da vanguarda, um modernismo sem utopia, numa terra ensolarada e aberta a experimentos.
É possível ver espalhadas pela cidade construções que moldaram seu pensamento, principalmente nos projetos de casas particulares, como a sua, em Santa Monica (1002, 22nd Street) -onde Gehry mora até hoje, desde que a reformou no final dos anos 70, aplicando materiais como madeira compensada, vidro e alumínio corrugado. (Há várias tomadas de Gehry no interior desta casa no documentário "Sketches of Frank Gehry", de Sidney Pollack.)
Ou o cartão-postal da cidade, o Walt Disney Concert Hall, um palácio reluzente de placas curvas de titânio, hoje símbolo da arquitetura de Gehry. A sala só ficou pronta em 2003, mas foi desenhada em 1991, depois do Pritzker e antes do museu Guggenheim de Bilbao (Espanha).

OS AMORES DE JOHN CAGE
O compositor, filósofo e colecionador de cogumelos John Cage (1912-92) ganhou nova biografia que retrata seu processo meticuloso de trabalho e também sua vida amorosa. "Begin Again", de Kenneth Silverman (ed. Alfred A. Knopf, 484 págs., US$ 26, R$ 45), conta detalhes de como foi criada a famosa composição silenciosa "4'33''", realizada em 1952. E também que seu primeiro relacionamento "sério" foi com um homem, na época do colégio, antes de se casar com Xênia Kashevaroff -que acabou deixando para ficar com o coreógrafo Merce Cunningham (1919-2009), numa das parcerias mais prolíficas da história das artes do século 20. Há passagens sobre sua filosofia zen e sobre as aulas que teve com o compositor austríaco Arnold Schoenberg em Los Angeles, onde nasceu.

IMAGENS DE ÍDOLOS
Dois livros chegaram às prateleiras no último mês com fotos raras de movimentos musicais que tiveram passagens importantes por Los Angeles nos anos 1970.
"The Beautiful & The Damned" (ed. Foggy Notion Books/Smart Art Press, 112 pags., US$ 28, R$ 48) traz 95 imagens inéditas da cena punk na cidade, registradas pela fotógrafa Ann Summa, que há 30 anos colabora com as revistas "Rolling Stone" e "Artnews".
Já "Bob Marley and the Golden Age of Reggae" (Titan Books, 160 pags., US$ 20, R$ 34) traz fotos de Kim Gottlieb, na época casada com um dos diretores da gravadora Island, Jeff Walker. Ela registrou os diversos encontros que teve com os músicos, na Jamaica e no escritório da empresa em Los Angeles. Está lá toda uma geração: Peter Tosh, Bunny Wailer, Toots Hibbert, Burning Spear e, claro, Bob Marley. O diretor Cameron Crowe (do filme "Quase Famosos") assina a introdução do livro.


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