São Paulo, domingo, 31 de julho de 2011

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DIÁRIO DE MOSCOU
O MAPA DA CULTURA

Mingau e circo

Oposicionismo e nacionalismo à beira do lago

MARINA DARMAROS

PARA O SELIGER 2011 --acampamento juvenil pró-Kremlin, realizado todo verão à beira do lago homônimo--, a oposição organizou, durante três chuvosos dias de junho, o primeiro Antisseliger.
O evento reuniu opositores de todas as vertentes --do Partido Iábloko ao Pirata (que defende a quebra de direitos autorais na internet)-- na polêmica floresta de Khímki, onde já se encontravam acampados ativistas contrários à construção de uma rodovia ligando São Petersburgo a Moscou.
À beira de um lago sem nome, a programação, com uma banda hippie contadora de histórias, não foi exatamente um êxito. As estrelas foram Evguênia Tchirikova, porta-voz dos ativistas de Khímki; Aleksêi Naválni, campeão de audiência do LiveJournal local na luta contra a corrupção no país; e Oleg Káshin, jornalista que foi espancado em 2010 por defender a inviolabilidade da floresta.
Enquanto os tratores trabalhavam na construção da rodovia em pleno fim de semana, o evento reuniu entre 200 e 500 pessoas por dia, segundo os organizadores --os acampados durante todo o mês de julho no Seliger seriam 10 mil "nashistas".
Os "nashistas" --de "Nashi", ou seja, "nosso", o movimento nacionalista juvenil-- entraram na berlinda mundial pelas mãos do terrorista norueguês Anders Behring Breivik, que em seu manifesto de 1.500 páginas, publicado na internet, exaltou Vladimir Putin e preconizou a criação, na Europa Ocidental, de uma "organização cultural conservadora" como a Nashi.
Para Serguêi Kalenik, autor dos quadrinhos "Super Putin" --as aventuras do premiê num país de zumbis--, o evento Antisseliger foi frustrante. "Não tinha mingau à vontade durante três dias, como eles prometeram, e censuraram meu gibi, que tinham prometido expor aqui", disse ele à Folha.

OS DEMÔNIOS
O atraso nos salários do renomado Teatro na Taganke, em Moscou, levou seu fundador Iúri Petrovitch Liubimov, 93, a pedir demissão, depois de 47 anos na direção artística e geral da casa.
A saída ocorreu durante turnê de "A Alma Boa de Setsuan", de Brecht, pela República Tcheca, quando o elenco se recusou a entrar em cena antes de receber os atrasados. Em entrevista, os atores chegaram a se declarar "escravos de Iúri Petrovitch e de sua mulher, Katalin Liubímova", a qual os estaria tratando de maneira desumana. O diretor rebateu afirmando ter colocado no teatro, do próprio bolso, "de 2 a 3 milhões de rublos" (de R$ 111 mil a R$ 166 mil).
A novela do afastamento de Liubimov estendeu-se do final de junho ao início de julho e envolveu até o ministro da Cultura, Aleksandr Avdeiev. Ele pediu aos atores que fizessem as pazes com o diretor e a Liubimov que deixasse as funções administrativas e se mantivesse apenas na direção artística.
Não houve reconciliação, entretanto, e o ministro acabou nomeando Serguêi Korotchenko para as funções de Liubímov.
Criado em 1964, o teatro teve seu ápice no "degelo de Khruschov" --entre meados de 1950 e o início dos 60, depois que o recém-empossado dirigente soviético Nikita Khruschov divulgou, em 1956, o seu famoso relatório que denunciou os crimes de Stálin, logo após a sua morte. Já foi considerado um espaço de vanguarda, mas, nos últimos anos, vivia certa decadência.
Depois do escândalo, Liubimov afirmou que vai reunir o elenco precedente do teatro para montar "Os Demônios", de Dostoiévski.

HOLLYWOOD VAI A MOSCOU
O 33º Festival de Cinema de Moscou (moscowfilmfestival.ru/eng) abriu em 23/6 com a estreia mundial de "Transformers 3". A première, que deveria atrair as atenções para o festival, acabou ofuscando o evento: na imprensa local e internacional, só se falou da escolha dos produtores do blockbuster pela capital russa, alvo certeiro de Hollywood.
Nem a presença do diretor israelense Amos Gitai no júri, nem o impensável prêmio de "realização de destaque na carreira de atriz e devoção aos princípios da escola de Stanislávski", concedido à atriz britânica Helen Mirren, conseguiram gerar tanta notícia quanto "Transformers".
Promessa de novos ares, o 2º Festival de Cinema Jovem Europeu "Voices" (voices-festival.org/en) realizou-se logo em seguida, de 5 a 10/7, na cidade de Vologda, 400 km ao norte de Moscou. A abertura da mostra, que neste ano homenageou o cinema italiano, ficou a cargo da diva ítalo-tunisiana dos anos 60 Claudia Cardinale.


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